MM Explica: como Taylor Swift recuperou o controle de seu catálogo e mudou o mercado da música

Caso Taylor Swift evidencia disputa por propriedade intelectual e força regravações como estratégia comercial para artistas na era dos fundos de catálogo.
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Nathália Pandeló
Taylor Swift recupera controle de seu catálogo (Crédito: Divulgação)

Depois de seis anos de disputas públicas e negociações frustradas, Taylor Swift anunciou que agora é oficialmente dona das gravações originais de seus seis primeiros álbuns (confira abaixo a carta oficial). O catálogo, que inclui de “Taylor Swift” (2006) a “Reputation” (2017), passou por duas mãos desde que deixou a gravadora Big Machine Records, mas finalmente está de volta ao controle da artista — incluindo álbuns, clipes, imagens e shows gravados.

A compra foi feita diretamente da Shamrock Capital, que havia adquirido os direitos da Ithaca Holdings, empresa de Scooter Braun. Segundo fontes próximas à negociação, o valor do acordo ficou bem abaixo das cifras bilionárias especuladas e próximo aos US$ 300 milhões pagos por Braun em 2019. Para Swift, o que importa é que, desta vez, foi uma negociação justa, sem cláusulas abusivas ou exigências de confidencialidade.

Como o caso começou

Tudo começou quando a Big Machine Records, responsável pelos primeiros lançamentos de Swift, foi vendida para a Ithaca Holdings em 2019. A artista, que já havia deixado o selo no ano anterior, afirmou que não foi informada previamente sobre a venda e que tentou comprar suas gravações, mas recebeu uma proposta considerada inaceitável: para cada novo álbum entregue, ela ganharia o direito de um antigo.

O acordo com Braun rapidamente se tornou público — e polêmico. Em um post nas redes sociais, Swift disse que não conseguia acreditar que seu catálogo tinha sido entregue a alguém com quem ela já havia tido desentendimentos, citando episódios envolvendo Kanye West e Justin Bieber. Do outro lado, executivos da gravadora contestaram a versão, e até capturas de tela de e-mails foram divulgadas para tentar provar que ela sabia da transação.

A resposta de Taylor Swift: regravar tudo

Taylor Swift recupera controle de seu catálogo (Crédito: Divulgação)

Em vez de se resignar, Swift anunciou que regravaria seus seis primeiros álbuns. A decisão, que parecia ousada no começo, virou um marco no mercado. As novas versões, lançadas sob o selo “Taylor’s Version”, dominaram paradas, foram adotadas em trilhas de filmes e séries, e passaram a ser priorizadas pelos fãs. Na prática, o movimento desvalorizou os masters que tinham sido vendidos sem sua aprovação.

Ao mesmo tempo, as regravações mostraram que o artista tem mais poder sobre sua obra do que se imaginava, mesmo quando a propriedade legal dos fonogramas está nas mãos de terceiros. O caso virou referência em negociações de novos contratos, com artistas emergentes cada vez mais atentos às cláusulas sobre propriedade dos masters.

O mercado reagiu

O impacto não foi só simbólico. A manobra de Taylor Swift influenciou o modo como fundos de investimento avaliam catálogos musicais, hoje tratados como ativos de longo prazo. No caso dela, a valorização dependia diretamente do apoio do público — e da disposição da artista em endossar (ou não) os fonogramas vendidos. Com a preferência pelo uso das novas versões, o retorno esperado pelos compradores caiu.

A Shamrock Capital, que adquiriu os direitos em 2020, acabou optando por negociar diretamente com a equipe de Swift. A venda não envolveu Braun, que já havia se desvinculado do ativo, e foi descrita por fontes próximas como uma “operação de boa fé”. A própria cantora agradeceu à empresa por, pela primeira vez, lhe oferecer a chance de comprar suas gravações “sem parceria, sem exigências, com total autonomia”.

O que muda agora

Taylor Swift recupera controle de seu catálogo (Crédito: Divulgação)

Com a compra, Swift passa a controlar tanto os fonogramas originais quanto as versões regravadas. Ela já lançou novas edições de quatro dos seis álbuns e confirmou que pretende finalizar o projeto com os dois últimos, embora sem pressa. O controle completo abre novas possibilidades de uso comercial, licenciamento e preservação do acervo, agora sob seu comando direto.

Mais do que uma vitória pessoal, o caso Swift provocou um efeito cascata na indústria. As gravadoras passaram a rever seus modelos de contrato, e os artistas agora têm mais clareza sobre a importância de manter o controle sobre suas gravações. O episódio também mostrou que, no mundo atual, a legitimidade artística pode pesar mais do que a posse legal.

A discussão sobre propriedade voltou ao centro

O movimento liderado por Taylor Swift reacendeu o debate sobre quem realmente deveria ter o poder sobre obras musicais. Mesmo durante os anos em que não tinha os direitos, ela conseguiu influenciar o comportamento do público, das plataformas e de outras empresas do setor. O valor simbólico e narrativo da obra passou a ser tão relevante quanto os contratos registrados em cartório.

Ao anunciar a compra do catálogo, Swift disse que estava “tomada por alegria” e relembrou as tentativas anteriores que não deram certo. A batalha, segundo ela, valeu a pena não apenas por razões pessoais, mas porque inspirou novos artistas a negociar melhor desde o início. O gesto final fecha um ciclo e consolida um novo modelo de atuação para músicos em tempos de plataformas, sincronia e fundos de catálogo.

Confira a carta de Taylor Swift na íntegra:

Oi.

Estou tentando organizar meus pensamentos de forma coerente, mas, agora, minha mente está apenas passando um slideshow. Uma sequência de flashbacks de todas as vezes em que sonhei acordada, desejei, implorei por uma chance de contar essa notícia para vocês. Todas as vezes em que estive tããããão perto, quase conseguindo, só para tudo desmoronar. Quase desisti de acreditar que isso poderia acontecer, depois de 20 anos tendo a cenoura balançada na minha frente e então puxada de volta. Mas isso ficou no passado agora. Desde que descobri que isso realmente vai acontecer, tenho chorado de alegria em momentos aleatórios. Finalmente posso dizer estas palavras:

Toda a música que eu já fiz… agora pertence a mim.

E todos os meus videoclipes.
Todos os filmes de show.
As capas de álbuns e fotografias.
As músicas inéditas.
As memórias. A mágica. A loucura.
Cada uma das eras.
Toda a obra da minha vida.

Dizer que esse é o maior sonho da minha vida realizado é até pouco. Aos meus fãs, vocês sabem o quanto isso foi importante para mim — tanto que regravei meticulosamente 4 dos meus álbuns, chamando-os de Taylor’s Version. O apoio apaixonado que vocês deram a esses álbuns e o sucesso que transformaram a The Eras Tour é o motivo de eu ter conseguido comprar minha música de volta. Não consigo agradecer o suficiente por me ajudarem a me reunir com essa arte à qual dediquei minha vida, mas que nunca tive posse até agora.

Tudo o que eu sempre quis foi a oportunidade de trabalhar duro o bastante para um dia poder comprar minha música de volta, completamente, sem cláusulas, sem parcerias, com total autonomia. Serei eternamente grata a todos da Shamrock Capital por serem os primeiros a me oferecer isso. A forma como eles conduziram todas as interações foi honesta, justa e respeitosa. Isso foi um negócio para eles, mas realmente senti que eles viram o que isso significava para mim: minhas memórias, meu suor, minha caligrafia e meus sonhos de décadas. Sou infinitamente grata. Minha primeira tatuagem talvez precise ser um grande trevo no meio da testa.

Eu sei, eu sei. E quanto ao Rep TV? Com total transparência: eu nem cheguei a regravar um quarto dele. O álbum Reputation foi tão específico para aquele momento da minha vida, e eu continuava esperando reencontrar aquele ponto de apoio emocional para recriá-lo. Toda aquela postura desafiadora, aquele desejo de ser compreendida enquanto me sentia propositalmente incompreendida, aquela esperança desesperada, aquele rosnado e travessura nascidos da vergonha. Para ser perfeitamente honesta, é o único álbum entre os primeiros 6 que achei que não poderia ser melhorado ao refazê-lo. Nem a música, nem as fotos, nem os vídeos. Então, continuei adiando. Haverá um momento (se vocês estiverem interessados na ideia) para as faixas inéditas do Vault daquele álbum emergirem. Já regravei completamente meu álbum de estreia, e realmente amo como ele soa agora. Esses dois álbuns ainda podem ter seus momentos de ressurgimento quando for a hora certa, se isso for algo que vocês ficariam animados em ver. Mas, se acontecer, não será mais a partir de um lugar de tristeza e saudade do que eu queria ter. Será apenas uma celebração agora.

Fico extremamente animada com as conversas que essa saga reacendeu na minha indústria entre artistas e fãs. Toda vez que um novo artista me conta que negociou a posse de suas gravações originais por causa dessa luta, lembro o quanto tudo isso foi importante. Obrigada por se importarem com algo que antes era considerado técnico demais para discussão pública. Vocês nunca saberão o quanto significa para mim que vocês se importaram. Cada pedacinho disso importou — e nos trouxe até aqui.

Graças a vocês e à sua boa vontade, trabalho em equipe e incentivo, as melhores coisas que já foram minhas… finalmente são de verdade.

Extremamente feliz e maravilhada,
Taylor

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