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Opinião: A importância do backoffice na vida do artista independente

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Redação

Banner Rodrigo Lampreia

E se eu te contar que 80% dos artistas que entram no meu estúdio ou na minha gravadora, não sabem a diferença entre obra e fonograma, associação e editora ou direito autoral e streaming royalties, você acredita? Talvez nem você, que sonha um dia em ser um grande artista, saiba. Pois é, essa tem sido uma das grandes lacunas que venho percebendo nos papos e reuniões com os novos artistas que tenho conhecido: a falta de conhecimento, informação e educação, no que diz respeito ao backoffice da carreira do artista independente inserido no music business.

A importância do backoffice na vida do artista independente
Foto: Unsplash

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Com a velocidade avassaladora das mudanças e novidades na indústria da música, ser um artista independente se tornou uma opção viável para muitos que acreditam em suas carreiras e entendem a música como um negócio. O espírito empreendedor é característica fundamental para o artista que pretende assumir o controle total de sua carreira e vislumbra sucesso no longo prazo. A construção e o desenvolvimento de uma carreira sustentável, rentável e promissora exige organização, conhecimento e capacitação, acima de tudo.

 Ser um artista independente é um desafio enorme para a nova geração Z de talentos potenciais que vem surgindo no mercado, nas plataformas de streaming e nas redes sociais. Mas por onde e como começar? É bem verdade que a música continua sim sendo a matéria-prima mais importante. Sem música, não existe artista, mas o que adianta ter o hit se você não entende o funcionamento do ecossistema que está inserido?

Antes de pensar em uma carreira e desenhar um planejamento estratégico, determinar suas metas, construir uma identidade artística, definir sua prateleira e audiência, buscar investimento e parcerias, gravar o single, EP ou álbum, fazer o plano de marketing e depois se lançar como um produto musical, o artista independente de 2023 precisa entender como funciona o mercado. E isso começa pela parte chata e burocrática. Justamente aquela que a grande maioria tende a negligenciar ou não tem acesso à informação para poder entendê-la propriamente.

A importância do backoffice na vida do artista independente
Foto: Divulgação

O compartilhamento de informação, o foco na educação e a capacitação de novos artistas tem sido pauta e propósito de grandes players do mercado. Vejo grandes agregadoras, associações de gestão coletiva, editoras, veículos de comunicação e até o ECAD, incluindo na pauta de suas comunicações e posts online, dicas, orientações e informações relevantes para auxiliar e capacitar novos artistas. A importância de se entender como funciona a coxia do mercado como um negócio vem sendo um alerta importante. E o mais delicado, os assuntos mais relevantes dessa coxia, tem a ver com a remuneração e os direitos desses artistas.

Entender a importância de estar devidamente organizado com relação a suas obras, fonogramas, cadastros e registros é o primeiro passo para a construção de uma carreira que vai trazer resultados no longo prazo. A consciência desses direitos trará benefícios e garantia da remuneração correta, a artistas que pretendem negociar seus próprios contratos. Sejam esses com selos independentes, distribuidoras, editoras e até possíveis collabs com outros artistas e marcas, licenciamento e novos negócios que a indústria pode proporcionar, através de oportunidades que surgirão ao longo do caminho.

Outro ponto crucial é o papel do advogado para o auxílio nas interpretações dos contratos assinados. Grande parte dos novos artistas assinam contratos sem ler ou entender. Geralmente estão mais preocupados com a foto da champagne no feed do que no teor daquele documento. E esse descaso pode ser fatal, sobretudo quando se tem, lá no fim,  aquela cláusula que fala de multa e rescisão, que muitas vezes destrói o sonho do artista quando ele decide rescindir aquele contrato. É claro que nem todo artista é obrigado a entender de cláusulas, leis e termos jurídicos, afinal de contas esse não é seu core business. Por isso a figura e o apoio de um profissional especializado no assunto é tão importante.

Ter o conhecimento dos seus contratos, direitos e a proteção e segurança de suas obras e fonogramas é o primeiro passo para se iniciar uma carreira independente. A partir daí, quem pretende gerenciar sua própria carreira, poderá então pensar em todo o resto da engenharia necessária para o desenvolvimento dessa caminhada.

Portanto, antes de pensar em compor, entrar em estúdio, construir uma discografia, fazer shows, firmar parcerias, montar suas estratégias, criar conteúdo, definir suas metas e elaborar seus planos para que tudo isso dê certo, procure organizar o backoffice da sua carreira. Essa consciência é fundamental para que você possa assumir o total controle da sua arte e então iniciar sua jornada no mundo da música. A verdade é que o artista independente de 2023, precisa de fato jogar nas onze e entender, por completo, o ecossistema do seu negócio, assumindo que ele de fato é um produto comercial e seu negócio funciona como qualquer outra indústria, que não seja caridade.

O dono da padaria pode ser o melhor assador de pães do mundo, mas se ele não souber fazer a conta do seu estoque, comparar o preço da farinha entre seus fornecedores, entender toda a logística que envolve sua produção, calcular seu preço de custo e, consequentemente, sua margem necessária de lucro e outras tantas habilidades básicas de backoffice do seu negócio, certamente não atingirá seus resultados e sua padaria será mais um fracasso comercial.

A importância do backoffice na vida do artista independente
Rodrigo Lampreia. Foto: Divulgação

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Com 20 anos de carreira musical, Rodrigo Lampreia é cantor, compositor, produtor musical e empreendedor de música e cultura. É co-fundador e CEO do selo independente Little Glass Records e idealizador, fundador e CEO do Soho Sessions, jam session que abraça novos artistas e fortalece a cena independente. Com cinco álbuns lançados, Lampreia já fez shows pelo Brasil e mundo a frente de projetos importantes como Samba de Santa Clara, Benditos, Sambinha, Roda do Lampra e sua carreira solo. Rodrigo também é o editor, produtor e apresentador do Podcast do Lampra, que debate tendências, novidades, informações sobre a indústria global da música.