PIB da música no Brasil alcança R$ 116 bilhões, com 81% vindos de eventos ao vivo, revela ANAFIMA

Setor da música no Brasil cresce com streaming, shows e direitos autorais; dependência de importações segue como um dos desafios, segundo a ANAFIMA.
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Nathália Pandeló
ANAFIMA divulga o PIB da Música no Brasil
ANAFIMA divulga o PIB da Música no Brasil (Crédito: Reprodução)

A edição 2025 do relatório da ANAFIMA sobre o PIB da música no Brasil revela um setor de dimensões bilionárias, que movimentou R$ 116,06 bilhões em 2024. O estudo mostra a música como ativo estratégico, mas também expõe desafios como a concentração geográfica e a dependência externa de equipamentos e instrumentos.

O relatório analisa toda a cadeia de valor, do mercado fonográfico às apresentações ao vivo, passando pelo comércio de instrumentos, empregos formais e a presença da música em igrejas. Mais do que números, o levantamento aponta tendências de consumo e transformação da indústria musical brasileira, que se consolida como uma das maiores do mundo.

ANAFIMA mostra os principais indicadores da música no Brasil
ANAFIMA mostra os principais indicadores da música no Brasil (Crédito: Reprodução)

O domínio da música ao vivo

O segmento de música ao vivo foi responsável por R$ 94 bilhões do PIB setorial em 2024, o equivalente a 81% do total. A ANAFIMA estima que o país tenha registrado mais de 100 mil datas de eventos no ano, com um ticket médio de R$ 432. O recorte mostra uma polarização: enquanto festivais regionais e independentes cobram ingressos de R$ 30 a R$ 250, megaeventos chegam a praticar valores de R$ 795 a R$ 1.100 na pista e acima de R$ 3.000 em áreas premium.

O impacto econômico dos grandes eventos impressiona. O Carnaval do Rio movimentou R$ 5 bilhões, seguido pelo Carnaval de Minas Gerais (R$ 4,7 bi), o Carnaval de São Paulo (R$ 3,4 bi) e o Carnaval de Salvador (R$ 2 bi). Entre os shows internacionais, a apresentação de Madonna em Copacabana atraiu 1,6 milhão de pessoas e gerou até R$ 469 milhões, enquanto o Lollapalooza Brasil alcançou até R$ 500 milhões.

O avanço do streaming

O streaming continua como principal receita da música gravada, segundo a ANAFIMA
O streaming continua como principal receita da música gravada, segundo a ANAFIMA (Crédito: Reprodução)

O mercado fonográfico brasileiro registrou faturamento de R$ 3,486 bilhões em 2024, um crescimento de 21,7% em relação ao ano anterior. Segundo os novos dados da ANAFIMA, o streaming domina a cena, com 87,6% da receita. As assinaturas geraram R$ 2,077 bilhões (68% do total), enquanto a publicidade em áudio e vídeo somou R$ 978 milhões.

O relatório destaca ainda que 93,5% das 200 músicas mais ouvidas no país em 2024 foram produções nacionais, evidenciando forte soberania cultural pela qual o Brasil já é conhecido. O Spotify manteve liderança absoluta, com 60,7% do mercado de assinaturas. Essa concentração mostra como as plataformas digitais seguem determinando estratégias de distribuição e promoção.

O peso dos direitos autorais

A arrecadação de direitos autorais pelo Ecad atingiu R$ 1,8 bilhão em 2024, um aumento de 12% em relação a 2023. Do total, R$ 1,5 bilhão foi distribuído a mais de 345 mil titulares, respeitando a divisão legal: 78% para compositores e editores e 22% para intérpretes, músicos executantes e produtores fonográficos.

Pela primeira vez, os serviços digitais se tornaram a principal fonte de arrecadação, respondendo por 26% do total, superando rádio, TV e eventos. O número de apresentações licenciadas também cresceu: foram 70 mil shows e festivais registrados em 2024, 11% a mais que no ano anterior.

Dependência externa de equipamentos

O setor de áudio e instrumentos movimentou R$ 14,6 bilhões em 2024, mas mantém dependência crítica de importações, que representam 99,1% do valor transacionado. As importações chegaram a US$ 577 milhões, contra exportações de apenas US$ 10,4 milhões, gerando déficit de US$ 566,6 milhões.

Isso significa que o músico brasileiro paga, em média, o dobro do que um consumidor nos EUA ou na Europa pelos mesmos equipamentos. A China respondeu por 67,8% das compras, e o Porto de Santos concentrou mais da metade das operações de entrada.

Empresas e empregos

O relatório da ANAFIMA revela que o ecossistema empresarial da música no Brasil é formado por 19.530 CNPJs. Desse total, 88,4% são microempresas e 47,3% operam como MEI. A concentração é clara: 53% das empresas estão no Sudeste, com destaque para São Paulo, que sozinho reúne 30,1%.

Em 2024, o setor empregou formalmente 13,3 mil trabalhadores, com saldo positivo de 1.618 vagas. A produção musical e a sonorização foram responsáveis por 40% das novas contratações. Estima-se ainda que o ensino de música empregue mais de 50 mil profissionais, somando redes formais e atividades complementares. A disparidade de gênero persiste: 64,4% das admissões foram de homens e 35,6% de mulheres.

Diante dos dados, o presidente da ANAFIMA, Daniel Neves, pontuou:

“O mapeamento de 19.530 empresas indica estrutura fragmentada, com 47,3% operando como MEI, o que amplia formalização, mas impõe limites de escala e proteção social. O  fenômeno exige políticas de qualificação, crédito e dados para a tomada de decisão.”

Neves ainda levantou uma demanda que ajudaria a guiar o setor no caminho oposto a essa informalidade:

“Diante disso, ainda que um sonho, criar a Agência Nacional da Música (AGEMUS) é uma necessidade de governança, com mandato para regulação inteligente, fomento orientado a resultados e inteligência de mercado. Sem coordenação, um setor que cresce de forma consistente e já demonstrou força global seguirá subalocado. O setor tem condições de gerar impacto econômico adicional quando políticas forem ancoradas em métricas e transparência metodológica”, analisa.

Imagem de uma variedade de guitarras expostas em um evento, com preços visíveis. Perfeita para amantes da música e músicos profissionais em busca de instrumentos de qualidade.
Crédito: Andrew King

Música e religião

A música religiosa também se destaca na economia. O Brasil tem quase 580 mil templos, que sustentam uma demanda contínua por instrumentos e sonorização. Igrejas evangélicas e católicas lideram em termos de formação de músicos e produção fonográfica, mostrando a força do gospel como um dos vetores de crescimento.

A presença desse segmento reforça a ideia de que a música no Brasil não se limita a entretenimento, mas atravessa cultura, fé e identidade social. Essa capilaridade ajuda a entender por que o setor alcança cifras tão expressivas.

Tendências de mercado

Os dados da ANAFIMA mostram que a música no Brasil segue em ritmo de expansão acelerada. O crescimento de 31% no número de eventos em 2025, a consolidação do streaming e o aumento da arrecadação de direitos autorais revelam um setor em transformação.

O desafio central está na redução da dependência de importações e na criação de políticas que apoiem a base empresarial formada por micro e pequenas empresas. Se o país conseguir alinhar produção, distribuição e consumo, o PIB da música tem potencial para crescer ainda mais nos próximos anos.

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