Cenas locais em 2025: movimentos regionais ganham espaço e moldam debates sobre diversidade e mercado

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Nathália Pandeló
Música brasileira - Crédito Fellipe Ditadi music
Música brasileira (Crédito: Fellipe Ditadi)

As cenas locais ganharam novo protagonismo em 2025. O Brasil já está familiarizado com esse cenário: segundo o Spotify, quase 70% das músicas mais ouvidas no país são de artistas brasileiros, índice que coloca o país entre os cinco mercados que mais consomem a própria música dentro da plataforma. Ainda assim, o movimento ficou mais evidente ao longo do ano, com a ascensão de artistas fora dos eixos tradicionais, a consolidação de novos polos criativos e a presença maior de eventos regionais que passaram a ocupar espaço relevante no calendário cultural.

Esse avanço não aconteceu de forma abrupta. Ele resulta da combinação entre consumo doméstico consistente, fortalecimento de ecossistemas locais e maior atenção das plataformas a repertórios de diferentes regiões. A partir dessa convergência, sons que antes circulavam de maneira restrita se tornaram parte das conversas nacionais, abrindo espaço para novas narrativas e impulsionando discussões sobre identidade e representatividade.

Diversificação de consumo e a força das regiões

Spotify
Crédito: Shantanu Kumar

Relatórios recentes ajudam a contextualizar o que se viu em 2025. A IFPI registrou, no Global Music Report de 2024, que a América Latina cresceu 19,4% em receitas de streaming, puxada por gêneros e artistas locais. Esse comportamento permanece no ano seguinte, e reforça a leitura de que o público da região tem preferência clara por repertórios nacionais.

No Brasil, o Spotify voltou a mencionar que o país está entre os mercados com maior consumo doméstico do mundo. A manutenção de cerca de 70% das faixas mais ouvidas sendo brasileiras cria um ambiente favorável para o crescimento de cenas regionais, que encontram públicos dispostos a descobrir novos sons dentro do próprio país.

O TikTok também auxilia a explicar essa dinâmica. Segundo dados divulgados pela plataforma, mais de 40% dos virais musicais do ano no Brasil tiveram origem em produções regionais. Isso inclui gêneros como bregadeira, pagodão, funk do Pará, arrocha pop, trap baiano e boi-bumbá. A velocidade de circulação desses sons transformou estilos hiperlocais em fenômenos nacionais, conectando artistas a públicos que antes eram difíceis de alcançar.

No YouTube Music Insights, cidades como Salvador, Recife, Belém, Manaus e Goiânia apareceram de forma recorrente entre os principais polos de descoberta. Os mapas de calor da plataforma mostram concentração de novos nomes nessas regiões, o que indica um ciclo mais estruturado de produção, distribuição e engajamento fora do eixo Rio-São Paulo.

Selos, editoras e festivais estruturam ecossistemas criativos

Viviane Batidão

O fortalecimento das cenas locais também se manifesta na infraestrutura do mercado. A ABRAPE registrou que festivais independentes e de médio porte tiveram crescimentos de público entre 20% e 50% nos últimos anos, tendência que se manteve em 2025. Esses eventos passaram a funcionar como vitrines para artistas regionais e como plataformas de conexão com marcas, produtores e agentes de mercado.

Selos e editoras de estados como Bahia, Pernambuco, Pará, Amazonas, Goiás e Minas Gerais cresceram de forma consistente, ampliando seus catálogos e estimulando a formação de repertórios com sotaques e identidades próprias. Esse desenvolvimento aparece também na arrecadação de direitos. A CISAC registrou aumento na América Latina, em parte associado ao avanço do consumo digital e ao fortalecimento de repertórios locais.

No streaming, a presença de curadorias dedicadas a movimentos regionais se intensificou. Radar Nordeste, Radar Amazônico e playlists específicas para trap baiano, música paraense ou sons do Ceará ganharam visibilidade e ajudaram a estruturar rotas de descoberta. A resposta do público manteve esses projetos ativos, mostrando que existe demanda por diversidade dentro do próprio país.

Identidade cultural e impacto no mercado

Entrada do Folks Pub Sertanejo - Crédito Henrique Campina, cenas locais
Entrada do Folks Pub Sertanejo (Crédito: Henrique Campina)

O avanço das cenas locais em 2025 trouxe novas discussões sobre pluralidade, acesso e representatividade. Ao ocupar playlists, festivais e trilhas de produções audiovisuais, artistas de diferentes regiões passaram a circular em ambientes antes concentrados em poucos centros urbanos.

Estudos da Luminate mostram que artistas classificados como emergentes regionais continuam apresentando crescimentos de dois dígitos em métricas como salvamentos e repetição de faixas. Esses dados ajudam o mercado a entender que cenas locais não são apenas fenômenos temporários. Elas formam comunidades, consolidam carreiras e sustentam ciclos de produção que agora entram no radar das plataformas, dos festivais e de iniciativas de marcas.

Em um país que sempre valorizou seus próprios artistas, 2025 marca um ponto de mudança. As cenas locais passaram a influenciar estratégias, reforçar identidades culturais e redesenhar parte da dinâmica da música brasileira. O resultado é um mercado mais aberto, mais diverso e mais atento ao que acontece em diferentes regiões.

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