A organização MusiCares divulgou os resultados da pesquisa Wellness in Music (WIM) 2025, que analisa o estado de saúde e as condições de trabalho de quem atua na indústria da música. O estudo mostra um aumento nos relatos de sofrimento emocional, além de uma redução no acesso a cuidados médicos e uma forte insegurança financeira entre os participantes.
O levantamento, que contou com quase 3.200 respondentes, indica que os desafios mentais se tornaram mais frequentes entre profissionais do setor. Em 2025, 11,4% dos entrevistados relataram ter passado por pensamentos autodestrutivos, número superior aos 8% registrados no ano anterior. Além disso, 15,4% afirmaram ter perdido um colega do meio musical para o suicídio.
A pesquisa também aponta que 20% conhecem alguém que sofreu assédio sexual e quase 10% conhecem vítimas de agressão sexual. No campo da saúde física, 35% vivem com alguma doença crônica, e quase metade desse grupo relatou que a condição interfere na capacidade de trabalhar. Apesar de 85% declararem ter plano de saúde, o índice caiu em relação a 2024 e segue abaixo da média nacional dos Estados Unidos.

Sofrimento emocional e fatores de risco
O crescimento dos relatos de sofrimento psíquico entre músicos acende um alerta. A pesquisa mostra que as taxas são ainda mais elevadas entre quem sofreu assédio, passou por situações de violência ou vive rotinas intensas de viagens e turnês. O estudo indica que esses grupos estão mais expostos à sobrecarga emocional, ao isolamento e à falta de suporte psicológico.
A rotina instável, a pressão por resultados e o excesso de trabalho aparecem como elementos centrais nesse cenário. A MusiCares recomenda que o setor priorize estratégias de prevenção e acolhimento voltadas à realidade da profissão, com foco em acesso a terapia, equilíbrio entre vida pessoal e profissional e ampliação das redes de apoio.
Acesso limitado à saúde e baixa adesão à prevenção
Mesmo entre os que possuem plano de saúde, quase metade depende de programas públicos ou do Affordable Care Act (lei que reduz os custos dos planos médicos), o que os torna vulneráveis a mudanças nas políticas de financiamento. A realização de exames preventivos, como mamografias e colonoscopias, é menor do que na média nacional americana, o que indica falhas no acompanhamento médico de rotina.
Para reduzir essa defasagem, a MusiCares realizou 5.300 atendimentos preventivos gratuitos no último ano e mantém parceria com a Music Health Alliance, que auxilia músicos na obtenção de cobertura médica e na negociação de dívidas hospitalares. Ainda assim, o relatório destaca que o acesso desigual a serviços básicos continua sendo um obstáculo grande.

Doenças crônicas e impacto no trabalho musical
Cerca de 35% dos respondentes afirmaram conviver com doenças crônicas, e quase metade relatou que isso interfere diretamente na capacidade de exercer atividades profissionais. O dado mostra a importância de uma visão ampla de saúde, que envolva de forma completa o bem-estar do corpo e da mente.
O relatório sugere que jornadas exaustivas, ausência de pausas e um ambiente competitivo aumentam os riscos de adoecimento. Para a MusiCares, medidas que promovam descanso adequado e acompanhamento médico regular são fundamentais para garantir sustentabilidade de carreira no longo prazo.
Pressão financeira e efeitos sobre o bem-estar
A dimensão financeira também aparece como um fator determinante. O estudo mostra que 78% dos participantes ganham menos de US$100.000 por ano e não conseguem se sustentar apenas com o trabalho musical. Entre eles, 40% associam a ansiedade a dificuldades financeiras, e 32% afirmam que a depressão tem a mesma origem.
No último ano, a MusiCares destinou mais de US$3 milhões a auxílios emergenciais para pagamento de aluguel, contas e despesas básicas. Além disso, a instituição oferece programas de educação financeira e aconselhamento, buscando reduzir o impacto da instabilidade econômica na saúde mental de seus beneficiários.

O alerta para o setor musical brasileiro
Embora os dados da pesquisa se refiram aos Estados Unidos, as tendências observadas também refletem alguns dos desafios enfrentados no Brasil. O mercado musical brasileiro é marcado pela informalidade e por grandes lacunas no acesso à saúde mental. Projetos como “Entre a arte e um mundo de incertezas: A saúde mental de músicos no Brasil”, além de estudos acadêmicos apoiados pela Fapesp, têm investigado como a rotina profissional afeta o equilíbrio psicológico dos artistas.
O país ainda carece de dados nacionais consolidados, mas pesquisas recentes confirmam que fatores como insegurança financeira, carga de trabalho irregular e ausência de políticas públicas de cuidado são determinantes para o adoecimento emocional. A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) oferece atendimento gratuito, mas lida com limitações de alcance e recursos.
A publicação do relatório da MusiCares logo após o Setembro Amarelo aponta para a necessidade de ações estruturais voltadas à saúde mental no setor musical. No Brasil, ampliar o acesso a tratamento psicológico, criar redes de apoio e incluir o tema em políticas culturais são passos fundamentais para que o cuidado com quem faz música deixe de ser uma exceção.
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