Viralização não garante construção de base de fãs, aponta estudo da MIDiA

A nova pesquisa da MIDiA mostra que a viralização nas redes sociais não tem se traduzido em streams ou fãs duradouros.
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Nathália Pandeló
MIDiA lança relatório sobre viralização e construção de base de fãs
MIDiA lança relatório sobre viralização e construção de base de fãs (Crédito: Divulgação)

Nos últimos anos, a indústria da música apostou alto na viralização como motor de crescimento. Selos, artistas e agências de marketing criaram estratégias baseadas em conteúdos constantes e campanhas com influenciadores, sustentadas pela lógica de que viralidade leva a streams, que por sua vez levariam a novos fãs. Mas um recente relatório da MIDiA Research, intitulado “All eyes, no ears | Why virality is not building fandom” (“Só olhos e nenhum ouvido: Por que a virilidade não está construindo base de fãs”), revela que essa equação está longe de ser garantida.

O estudo analisou os hábitos de descoberta musical de mais de 10 mil consumidores em diversos países e concluiu que a viralização, em muitos casos, se esgota na experiência do clipe. Em vez de converter ouvintes ocasionais em seguidores leais, a exposição em plataformas como TikTok e Instagram tem competido diretamente com o tempo dedicado ao streaming, que é a principal fonte de receita para a indústria da música gravada.

Descoberta fragmentada

YouTube na tela de um celular
(Crédito: Free Stocks)

Segundo o relatório, a descoberta musical hoje é altamente fragmentada. O YouTube lidera como fonte de alcance, citado por 52% dos consumidores, seguido por serviços de streaming (40%) e TikTok (37%). No entanto, nenhum canal domina de forma isolada, e sete fontes diferentes registraram ao menos 10% de participação. Isso mostra que, apesar da popularidade das redes sociais, elas são apenas uma parte de um ecossistema muito mais amplo.

O levantamento também aponta diferenças demográficas importantes. Enquanto os mais jovens tendem a se concentrar em plataformas como o TikTok, os públicos mais velhos ainda dão preferência ao rádio e ao YouTube. O recorte etário de 16 a 24 anos, apesar de central nas estratégias de marketing, representa apenas 12% dos consumidores que descobrem música no TikTok. Em outras palavras, ao priorizar esse grupo, a indústria negligencia 88% do restante da população.

O funil de descoberta emperrado

MIDiA explica como funciona o funil de novos ouvintes
MIDiA explica como funciona o funil de novos ouvintes (Crédito: Reprodução)

Um dos pontos centrais do estudo é o chamado funil de descoberta. A lógica tradicional prevê que, após ouvir uma música nas redes sociais, o consumidor deveria procurar pelo artista, salvar a faixa em plataformas de streaming, explorar mais do catálogo e, finalmente, tornar-se fã. Porém, esse caminho está enfraquecido, sobretudo entre os mais jovens.

Quase metade dos consumidores (48%) não ouviu nas plataformas de streaming as músicas descobertas em redes sociais no último mês. Entre os que ouviram, menos de um terço evoluiu para a condição de fã. A conversão de seguidores também é baixa: apenas 26% dos que seguiram artistas no TikTok passaram a ouvir mais de suas músicas, contra 45% em outras redes.

A competição entre social e streaming na era da viralização

Motivos porque as redes sociais não levam a novos ouvintes fieis, segundo a MIDiA
Motivos porque as redes sociais não levam a novos ouvintes fieis, segundo a MIDiA (Crédito: Reprodução)

Outro dado relevante é que, em vez de gerar novos streams, os vídeos curtos têm funcionado como substitutos. Para 28% dos jovens entre 16 e 24 anos, a principal barreira para migrar ao streaming é a sensação de que já ouviram o suficiente nas redes sociais. Esse comportamento mostra que a dinâmica da atenção, cada vez mais disputada, tem transformado o entretenimento em um jogo de soma zero, em que o crescimento das plataformas sociais ocorre às custas de outras formas de consumo.

O relatório lembra que essa não é uma situação inédita. O YouTube, no passado, enfrentou dilema semelhante, mas acabou se consolidando como destino de consumo musical com a criação do YouTube Music. Agora, o TikTok enfrenta uma encruzilhada: continuar como vitrine de descobertas passageiras ou assumir um papel mais robusto no ecossistema musical, com modelos de receita mais claros.

Lições para artistas, gravadoras e plataformas

A pesquisa sugere que os artistas devem priorizar a clareza de identidade e narrativa, além de escolher os canais certos para se conectar com o público. A primeira impressão, destaca a MIDiA, é decisiva. Se o contato inicial do ouvinte for apenas com um trecho de música, será esse fragmento que ele buscará repetir, e não necessariamente o catálogo do artista.

Para gravadoras e detentores de direitos, a recomendação é colocar artistas em plataformas, não apenas dentro delas, investindo em espaços que favoreçam a escuta completa e a construção de comunidades. Já para as plataformas, a escolha é inevitável: definir se sua função principal será marketing, consumo ou uma combinação dos dois.

Um futuro ainda em disputa

Apesar das dificuldades, o estudo aponta uma brecha otimista. Mais da metade dos jovens de 16 a 24 anos (55%) afirmam estar mais interessados em descobrir novas músicas e metade espera que esse interesse cresça. Isso indica que há espaço para um modelo de descoberta mais eficiente, que vá além da viralização instantânea e se converta em uma base de fãs sustentável.

O desafio, portanto, está em transformar o interesse inicial em engajamento profundo, num cenário em que a música compete por atenção lado a lado com outros conteúdos digitais. A viralização pode continuar gerando hits, mas para a construção de carreiras no longo prazo, a indústria precisará reinventar suas estratégias.

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