Morreu na noite de domingo (2), em Belo Horizonte, o cantor e compositor Lô Borges, aos 73 anos. Um dos criadores do Clube da Esquina, movimento que marcou a história da música brasileira nos anos 1970, o artista estava internado desde 17 de outubro por complicações decorrentes de uma intoxicação medicamentosa. Segundo boletim médico divulgado pela Unimed, ele faleceu em decorrência de falência múltipla de órgãos.
Figura central na MPB e referência da chamada “geração mineira”, Lô Borges construiu uma trajetória marcada pela coerência e pela continuidade. Mesmo longe do circuito da fama, manteve uma presença ativa na cena musical, lançando álbuns, colaborando com novos artistas e explorando sonoridades que uniam simplicidade e experimentação. Seu último trabalho, “Céu de Giz”, feito em parceria com Zeca Baleiro, foi lançado em agosto de 2025.
O início de uma trajetória singular
Nascido em 10 de janeiro de 1952, em Belo Horizonte, Salomão Borges Filho cresceu em uma família de 11 irmãos, entre eles os também músicos Márcio, Telo e Marilton Borges. No fim dos anos 1960, passou a se reunir com amigos no bairro Santa Tereza, onde conheceu Milton Nascimento, Beto Guedes e Fernando Brant. Daquelas reuniões informais surgiu o embrião do Clube da Esquina, coletivo que redefiniria a música popular brasileira ao misturar MPB, rock, jazz e elementos da cultura mineira.
Em 1972, aos 20 anos, Lô assinou com Milton o álbum “Clube da Esquina”, considerado um marco na história da canção brasileira. O disco é recorrente nas listas de maiores da história: ocupa a 7ª posição na Rolling Stone Brasil, aparece entre os melhores álbuns latino-americanos segundo o The Guardian e figura na 9ª colocação do ranking mundial da Paste Magazine.
No mesmo ano, lançou seu primeiro disco solo, “Lô Borges”, conhecido como o “Disco do Tênis”, pela capa com um par de tênis fotografado por Cafi. Com composições como “O Trem Azul”, “Um Girassol da Cor do Seu Cabelo” e “Paisagem da Janela”, ele consolidou um estilo harmônico próprio, que se tornaria referência para diferentes gerações de músicos.
Um compositor que preferiu o tempo à pressa
Após o sucesso dos primeiros álbuns, Lô se afastou temporariamente do mercado e viveu uma fase de reclusão. Retornou em 1979 com “A Via Láctea”, seguido por lançamentos pontuais nas décadas seguintes. A volta à mídia ocorreu em 2003, quando compôs “Dois Rios” com Samuel Rosa e Nando Reis, gravada pelo Skank. A canção o reconectou ao público jovem e marcou o início de uma nova fase criativa.
Entre 2019 e 2025, mais especificamente, manteve uma sequência regular de lançamentos: “Rio da Lua”, “Dínamo”, “Muito Além do Fim”, “Veleiro” e “Não Me Espere na Estação”, este indicado ao Latin Grammy na categoria “Melhor Álbum de Rock ou Música Alternativa em Língua Portuguesa”. O período consolidou a retomada de sua produção autoral e a aproximação com novos parceiros.
Em 2022, celebrou 50 anos de carreira com dois concertos na Sala Minas Gerais, ao lado da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais. O registro virou o álbum “50 Anos de Música – Ao Vivo na Sala Minas Gerais”, lançado pela Deck em 2023, com arranjos sinfônicos de canções como “Equatorial” e “Vento de Maio”.
O som de Minas e o alcance de uma linguagem
A música de Lô Borges ajudou a consolidar o que se convencionou chamar de “som de Minas Gerais”, uma estética que une harmonias elaboradas, melodias suaves e um olhar contemplativo sobre o cotidiano. Embora o termo seja amplamente associado ao Clube da Esquina, essa sonoridade se expandiu para além do grupo. Artistas de múltiplos estados, como Flávio Venturini, Paulinho Moska, Fernanda Takai e Zeca Baleiro, reinterpretaram elementos desse repertório, mantendo viva a influência de Lô.
A projeção também ultrapassou fronteiras. Em 2018, Alex Turner, do Arctic Monkeys, citou o “Disco do Tênis” como uma das inspirações para o álbum “Tranquility Base Hotel & Casino”. A menção reforçou o caráter atemporal de sua obra, que segue sendo descoberta por novas gerações e públicos fora do Brasil.

Um legado em construção
Ao longo de mais de 50 anos de carreira, Lô Borges preferiu a constância ao estrelato. Foi um artista de processos longos, movido pela curiosidade musical. Seu repertório, hoje estudado por músicos e pesquisadores, atravessa estilos e formatos sem perder coerência. A mistura entre poesia, introspecção e liberdade harmônica fez dele um dos compositores mais respeitados do país, ainda que discretamente.
Mais do que fundador de um movimento, Lô Borges representou uma forma de fazer música baseada em escuta, afeto e experimentação. Suas canções seguem circulando nas rádios, nas plataformas e nas interpretações de novos artistas, lembrando que algumas obras não precisam de visibilidade constante para permanecer.
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