Dando continuidade à série de entrevistas do “Balanço 2025”, o Mundo da Música conversa com executivos que atuam em escala global, mas com forte enraizamento nos mercados locais. A proposta segue a mesma: analisar 2025 a partir de dados, comportamento do público e decisões estratégicas que ajudam a entender como a indústria brasileira se posiciona em um cenário cada vez mais competitivo e conectado.
Nesta edição, o foco recai sobre a consolidação do repertório nacional, o papel dos superfãs, a força dos gêneros populares e a importância de estratégias que priorizam longevidade artística em vez de picos momentâneos. Em um ano marcado por desaceleração em mercados maduros e saturação de lançamentos, a leitura passa a ser menos sobre volume bruto e mais sobre engajamento qualificado, identidade cultural e desenvolvimento sustentável.
A entrevistada é Alejandra Olea, Managing Director de Américas da Believe, responsável pelas operações da companhia na América Latina, Estados Unidos, Canadá, Espanha e Portugal. Reconhecida como uma das executivas mais influentes do mercado global, Alejandra analisa os principais movimentos de 2025, o desempenho do repertório brasileiro, os desafios enfrentados pelo setor e as oportunidades que se desenham para 2026.
Balanço 2025: Alejandra Olea, Managing Director de Américas da Believe
Mundo da Música: Quando você olha para 2025 como um todo, quais números melhor resumem o desempenho do mercado de música no Brasil este ano? Pode incluir receita, consumo, catálogo, shows, marketing ou qualquer indicador que tenha sido decisivo, na sua visão.
Alejandra Olea: 2025 foi um ano marcado por escala, consistência e consolidação. O Brasil reforçou sua posição como um dos mercados musicais mais dinâmicos do mundo, com crescimento contínuo tanto no consumo quanto na geração de receita. O streaming pago seguiu como principal motor do setor, enquanto a liderança sustentada do repertório nacional confirmou a maturidade e a resiliência do ecossistema local. A receita proveniente de assinaturas avançou, o catálogo ganhou maior relevância e os hábitos de escuta passaram a indicar um engajamento mais duradouro, em vez de picos pontuais de consumo.
Na Believe, nossos indicadores de crescimento combinam alinhamento com o mercado e impacto real nos artistas. Em 2025, esses indicadores apontavam para uma expansão em toda a cadeia produtiva: crescimento acelerado do streaming, aumento de dois dígitos na participação de plataformas premium, maior engajamento dos super fãs e um volume maior de lançamentos relevantes em nível nacional e com maior longevidade.
O desempenho artístico segue sendo nosso principal termômetro de sucesso. O ano histórico de João Gomes – coroado por uma vitória no Latin Grammy e múltiplos reconhecimentos como Artista do Ano – evidencia a solidez do nosso modelo de desenvolvimento. Paralelamente, sucessos crossover como “Descer Pra BC”, de Brenno & Matheus, que dominou as paradas musicais no Brasil e em Portugal por meses, misturando sertanejo com elementos eletrônicos, e “Mãe Solteira”, que surgiu de um camp de composição organizado pela Believe em parceria com a Fortal Music, ilustram como a música brasileira pode alcançar escala cultural e comercial quando criatividade, dados e estratégia estão alinhados.
Em conjunto, esses resultados reforçam o posicionamento da Believe como uma empresa global de desenvolvimento de artistas, que integra expertise local, tecnologia e uma operação internacional para apoiar o crescimento sustentável dos artistas – do acesso ao mercado à consolidação do sucesso.
Mundo da Música: Quais áreas da operação cresceram mais em 2025 e quais ficaram estáveis ou em queda? Que leitura esses movimentos geram sobre o momento do mercado?
Alejandra Olea: O crescimento mais expressivo veio de frentes diretamente conectadas ao repertório nacional e aos gêneros populares, com a Believe consolidando sua liderança no forró, hoje um dos principais vetores de consumo musical no Brasil. Artistas como João Gomes, Nattan, Felipe Amorim, Solange Almeida, Xand Avião, Iguinho & Lulinha e Manim estiveram de forma consistente entre os destaques das plataformas de streaming, dos charts e dos palcos ao longo de todo o ano.
A trajetória de João Gomes é emblemática desse movimento. Seu alcance cultural e o reconhecimento em premiações reforçam como o forró ultrapassou amplamente suas origens regionais. Em paralelo, Felipe Amorim se firmou ainda mais como um dos artistas mais consistentes do país em geração de hits, alcançando mais um Top1 com “Eu Vou Na Sua Casa” e entregando alguns dos shows mais celebrados do Brasil. Nattan também se destacou como um artista de apelo verdadeiramente popular, com uma das agendas de turnê mais disputadas do cenário nacional.
Outro pilar claro de crescimento foi a frente de serviços criativos. A colaboração estruturada – incluindo camps de composição e estratégia de conteúdo – se mostrou um diferencial decisivo. “Mãe Solteira”, criada durante um camp de composição organizado pela Believe em parceria com a Fortal Music, é um exemplo direto de como ambientes criativos curados podem gerar sucessos de forte impacto cultural e relevância duradoura.
Gêneros como arrocha e brega também se mantiveram como frentes estratégicas de crescimento, com artistas como Pablo e Priscila Senna reafirmando a força desses estilos e a lealdade de seus fãs. Além disso, a parceria com a Sonar Music ganhou ainda mais relevância em 2025, com nomes como MC Tuto, DJ Boy e Joãozinho VT impulsionando cenas urbanas e formatos de descoberta ao longo do ano.
Já os formatos mais tradicionais apresentaram estabilidade, em linha com as tendências do mercado global. No conjunto, esses movimentos confirmam que o crescimento no Brasil é impulsionado pela cultura local, pela força do ao vivo e por estratégias centradas no artista, sustentadas por uma inteligência regional aprofundada.
Mundo da Música: Como evoluiu o consumo de música no Brasil em 2025 na sua perspectiva? O que mudou nos números de streams, catálogo, repertório local, superfãs, descoberta ou formatos?
Alejandra Olea: Relatórios públicos das plataformas indicam que o Brasil seguiu batendo recordes de tempo médio diário de escuta, com os gêneros nacionais sendo os principais responsáveis por esse crescimento. Os formatos de descoberta – especialmente vídeos de curta duração e playlists algorítmicas – aceleraram a explosão de novos sucessos e encurtaram o caminho entre o lançamento e a relevância cultural.
Ao mesmo tempo, o comportamento dos superfãs se tornou cada vez mais determinante. Núcleos de engajamento mais profundo passaram a ter papel central na sustentação das músicas ao longo de ciclos mais longos, sobretudo no caso de artistas com identidade bem definida, forte presença ao vivo e conexão genuína com suas comunidades.
O repertório nacional foi claramente beneficiado por essa dinâmica. Gêneros como forró, piseiro, funk, trap e brega apresentaram maior retenção e recorrência de consumo. No portfólio da Believe, esse movimento se traduziu em maior fidelização do público e ciclos de vida mais longos dos lançamentos, confirmando que o público brasileiro está cada vez mais escolhendo artistas brasileiros – e permanecendo com eles ao longo do tempo.
Mundo da Música: Há algum dado interno de comportamento do público em 2025 que você acredita ser relevante para o mercado conhecer? Algo que tenha alterado decisões ou estratégias, por exemplo.
Alejandra Olea: Embora não possamos divulgar números internos, uma tendência foi evidente: a aceleração das colaborações entre diferentes regiões do país. Observamos um aumento consistente na sobreposição de públicos entre gêneros de forte origem nordestina – como forró, piseiro e brega – e estilos urbanos como trap e funk.
Esse comportamento influenciou diretamente nossas decisões estratégicas, reforçando investimentos em ambientes colaborativos e iniciativas que promovem o diálogo entre gêneros. Os dados mostram de forma consistente que projetos construídos na interseção entre identidade regional e estética contemporânea geram maior conexão com o público e ampliam significativamente seu alcance.
Mundo da Música: O ano teve desafios importantes. Quais números deixaram evidente que o setor precisou ajustar expectativas ou revisar projeções?
Alejandra Olea: Relatórios globais da IFPI e da MIDiA apontaram uma desaceleração no crescimento da receita de streaming, especialmente em mercados mais maduros. Embora o Brasil tenha mantido a força em volume e engajamento, o cenário exigiu uma mudança clara de foco – da busca exclusiva por escala para a qualidade do engajamento, a construção sustentável de base de fãs e o desenvolvimento artístico de longo prazo.
Outro desafio relevante foi a saturação de conteúdo. Com um volume cada vez maior de lançamentos semanais, a diferenciação tornou-se mais complexa, demandando estratégias editoriais mais precisas, janelas de lançamento mais intencionais e um entendimento aprofundado do comportamento do público e da dinâmica das plataformas.
É exatamente esse o contexto que a estratégia “From Access to Success” (“Do Acesso ao Sucesso”) se propõe a endereçar. Em um momento em que o acesso às audiências nunca foi tão amplo, torna-se essencial apoiar artistas e selos na transformação desse acesso em sucesso real – alcançando públicos relevantes, expandindo suas bases de fãs e levando suas carreiras a novos patamares, a partir de um entendimento profundo e proprietário do ecossistema de marketing digital da música.
Para a Believe, esses desafios reforçaram a importância de um crescimento ético e sustentável. Iniciativas como a redução significativa de atividades anômalas de streaming fazem parte dessa mesma visão – garantindo que o sucesso seja impulsionado por conexões genuínas com o público e por impacto cultural mensurável, e não por picos artificiais de curto prazo.

Mundo da Música: Falando em artistas, que tipo de crescimento vocês observaram no desempenho de lançamentos, marketing, turnês ou retenção de público em 2025? Há métricas concretas que ilustram essa evolução?
Alejandra Olea: Em 2025, o crescimento mais consistente aconteceu justamente no ponto de convergência entre performance digital, impacto cultural e relevância ao vivo – e foi nesse cruzamento que a força da Believe se destacou com mais clareza. O ano histórico de João Gomes definiu o ritmo, mas esse movimento se espalhou por diferentes gêneros e se refletiu em artistas e selos de todo o cast da Believe Brasil.
No ambiente digital, os lançamentos foram potencializados pela expertise aprofundada da Believe nas plataformas, por uma segmentação de público mais inteligente e pelo acompanhamento de desempenho em tempo real. A aplicação desse know-how digital, marca registrada da companhia, fez com que as campanhas não se limitassem a picos iniciais, mas ganhassem fôlego ao longo do tempo. O resultado foi maior longevidade nos charts, crescimento consistente de ouvintes mensais e um fortalecimento da fidelização dos fãs – indicadores claros de um desenvolvimento artístico mais sólido e de expansão real de audiência.
O mercado de shows também voltou com força, especialmente nos gêneros forró, piseiro e na música popular. Artistas como Nattan, Felipe Amorim, Pablo e Priscila Senna utilizaram os insights digitais e o conhecimento de mercado da Believe para tomar decisões mais estratégicas sobre turnês. Os efeitos foram evidentes: apresentações com ingressos esgotados de forma recorrente, alta demanda em festivais e aumentos relevantes de streaming nos períodos próximos às datas ao vivo.
No conjunto, esse cenário evidencia como a combinação entre expertise digital, entendimento cultural e execução local da Believe permite transformar dados em relevância concreta no mundo real – impulsionando crescimento sustentável, conexões mais profundas com os fãs e carreiras artísticas de longo prazo.
Mundo da Música: Se você tivesse que escolher um único indicador que mostra onde a indústria brasileira está indo, qual seria? E como esse número evoluiu em 2025?
Alejandra Olea: O indicador mais claro desse movimento é o crescimento contínuo da participação do repertório nacional no consumo total de música no Brasil.
O país figura de forma consistente entre os líderes globais em participação de música local no consumo, e esse índice segue em expansão. Esse avanço aponta para algo que vai além do tamanho do mercado: o Brasil está se consolidando como uma verdadeira potência cultural, capaz de exportar sons, estéticas, produtores e talentos da composição.
Do forró ao brega, do funk ao trap e aos formatos híbridos de pop urbano, a música brasileira passa a influenciar cada vez mais as conversas globais — impulsionada, antes de tudo, pela força e pelo engajamento do seu próprio público.
Mundo da Música: Que oportunidade de 2025 apareceu de forma mais clara quando vocês analisaram os dados internos? Pode ser um comportamento, um formato, um tipo de artista ou uma dinâmica de mercado.
Alejandra Olea: Uma oportunidade se destaca de forma transversal a todos os segmentos: a colaboração criativa como motor de crescimento. A trajetória de “Mãe Solteira” comprovou como ambientes artísticos estruturados — como camps de composição, hubs de produção e colaborações entre diferentes gêneros — podem acelerar o surgimento de sucessos e abrir caminhos de circulação entre regiões.
Outra frente clara de oportunidade está na ampliação da fusão entre gêneros locais: piseiro com trap, funk com forró, influências afro-brasileiras dialogando com o pop. O comportamento do público aponta de forma consistente para o interesse por sonoridades híbridas. Artistas que transitam por esse território de forma autêntica conseguem ampliar seu alcance sem perder profundidade cultural.
Mundo da Música: Para 2026, quais projeções numéricas vocês já conseguem antecipar? Não precisam ser números exatos, mas tendências ou estimativas que indiquem o que esperar do próximo ciclo.
Alejandra Olea: Embora as projeções públicas da IFPI e da MIDiA indiquem que o crescimento global do streaming deve se manter estável – e não mais em ritmo acelerado -, o Brasil segue bem-posicionado para continuar, em 2026, como um dos mercados de streaming de maior volume e engajamento do mundo. As tendências já apontam com clareza para alguns movimentos centrais:
● O repertório nacional deve ampliar ainda mais sua participação no consumo, reforçando o que os dados públicos vêm mostrando de forma recorrente: o público brasileiro escolhe cada vez mais vozes brasileiras.
● A fusão entre gêneros tende a se intensificar, especialmente entre forró, piseiro, funk, trap e pop – um movimento já visível nas tendências das plataformas e na ascensão de artistas híbridos que dominam os formatos de descoberta.
● A monetização dos superfãs deve se tornar um pilar estratégico, à medida que as plataformas digitais lançam novos produtos e ferramentas voltados ao aprofundamento do engajamento e à valorização das audiências mais fiéis.
● Os formatos de descoberta em vídeo curto continuarão impulsionando novos destaques, mas a retenção de longo prazo dependerá cada vez mais de artistas com estratégias sólidas de construção de comunidade.
● A música brasileira seguirá ampliando sua presença internacional, com destaque para os sons oriundos do Nordeste e das cenas urbanas, que vêm ganhando tração na América Latina, na Europa e nos mercados lusófonos.
Para a Believe, essas projeções reforçam a solidez do nosso modelo como uma empresa global de desenvolvimento de artistas. Em 2026, enxergamos ainda mais oportunidades de escalar artistas do acesso ao sucesso por meio de:
● colaborações mais profundas entre diferentes regiões do Brasil
● ambientes criativos cada vez mais estruturados, como camps, hubs e laboratórios de cocriação
● integração ainda mais forte entre nossos times locais, tecnologia e parcerias com plataformas
● e investimentos contínuos para apoiar artistas locais a se tornarem forças culturais globais.
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