Spotify anuncia novos recursos no plano gratuito para engajar ouvintes e atrair anunciantes

O Spotify ampliou recursos do plano grátis, permitindo buscar e tocar qualquer música, e mira aumento de receita publicitária sem perder conversão para o Premium.
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Nathália Pandeló
Agora, usuários gratuitos do Spotify podem ver as letras das músicas
Agora, usuários gratuitos do Spotify podem ver as letras das músicas (Crédito: Divulgação)

O Spotify começou a liberar globalmente uma atualização que flexibiliza as limitações do plano gratuito no celular. A partir de agora, os usuários com anúncios podem pesquisar e reproduzir faixas específicas, além de tocar imediatamente músicas compartilhadas por amigos e artistas nas redes sociais (opções historicamente disponíveis apenas para assinantes Premium). A medida altera um dos pilares do modelo freemium da plataforma, que até aqui mantinha o shuffle como experiência padrão para quem não paga.

A movimentação ocorre após um período de pressão sobre a performance publicitária do serviço e do próprio segmento de “free streaming”. Segundo o Music Business Worldwide, a empresa aposta em maior engajamento para impulsionar a receita com anúncios e, no médio prazo, fortalecer o funil de conversão para o plano Premium. Em entrevista ao site, o vice-presidente de Mercados e Assinaturas da plataforma, Gustav Gyllenhammar, afirmou: “ter tanto o gratuito quanto o premium é a pedra angular da estratégia do Spotify” e que a companhia “sentiu que era hora de dar um brilho ao Free”.

O que muda no gratuito

De acordo com o anúncio oficial, três ações ficam habilitadas para contas com anúncios no celular: escolher e tocar qualquer música no app, buscar uma faixa específica e reproduzi-la, e tocar canções abertas a partir de links compartilhados em redes sociais. A empresa descreve a atualização como uma forma de dar mais controle sobre como o público ouve, sem alterar os diferenciais do Premium, como o áudio lossless recém-lançado, criação de playlists com inteligência artificial e ambiente sem anúncios. A liberação é gradual e inclui o Brasil nas versões recentes dos apps para iOS e Android.

Para o público, a novidade remove um atrito antigo da experiência gratuita no celular e aproxima o uso cotidiano de recursos já conhecidos das playlists personalizadas e editoriais, como Descobertas da Semana, Radar de Novidades e daylist. Em paralelo, houve reação imediata de parte dos assinantes questionando o incentivo para permanecer no Premium, ponto que a empresa tenta resolver mantendo uma diferença clara de benefícios e qualidade de áudio para quem paga.

O desenho do freemium no Spotify

Spotify
Crédito: Shantanu Kumar

No recorte de audiência, a base gratuita é majoritária e estratégica para abastecer o inventário publicitário e o funil de assinaturas do Spotify. Em agosto, a plataforma somava 696 milhões de ouvintes mensais, dos quais 433 milhões no plano gratuito e 276 milhões no Premium. A companhia também reforça que muitos dos recursos de descoberta continuam disponíveis para todos, enquanto funcionalidades como áudio em alta fidelidade e Mix permanecem como diferenciais do pago.

Há, contudo, alguns pontos a serem observados. O acesso sob demanda no gratuito será limitado por tempo diário, ainda sem duração divulgada. Gyllenhammar disse ao MBW que usuários sem assinatura continuarão expostos a anúncios e que funções como enfileirar músicas seguem reservadas ao Premium, mantendo uma fronteira clara entre as duas camadas.

Pressões de mercado e acordos

O ajuste no gratuito chega em um contexto de busca por crescimento na publicidade e de competição com plataformas de vídeo e redes sociais que oferecem controle sob demanda como padrão. Gyllenhammar disse que a mudança responde a hábitos da Geração Z, que “realmente sentiam que a antiga experiência gratuita do Spotify no celular estava quase quebrada, no sentido de que tentavam clicar em coisas e não funcionava”. 

Ele também indicou uma sintonia com os grandes detentores de direitos, afirmando: “obviamente temos alinhamento com nossos parceiros da indústria nesse recurso”. Ou seja, a empresa recebeu a bênção das gravadoras major que detêm ações no Spotify.

O executivo pontuou ainda que a decisão de incluir o áudio lossless no Premium padrão reflete a dinâmica atual do mercado, no qual “já não havia mais possibilidade de cobrar pelo lossless como uma função separada ou adicional”. A leitura aponta um reposicionamento amplo do portfólio de produtos, com o freemium ganhando atratividade para reter jovens, enquanto o Premium preserva funcionalidades e o ambiente sem anúncios entre músicas como valor central.

Spotify libera o recurso de áudio lossless para assinantes premium
Spotify libera o recurso de áudio lossless para assinantes premium (Crédito: Divulgação)

Impactos para o mercado da música

Do lado da indústria, a flexibilização do gratuito tende a aumentar o tempo e a frequência do uso, o que pode elevar as impressões publicitárias em momentos de alta sazonal como o quarto trimestre. O Music Business Worldwide relata que o Spotify testou as mudanças por 18 meses em múltiplos mercados, observando um impacto positivo em retenção de ouvintes e desempenho de formatos de anúncios. O raciocínio é direto: se o usuário gratuito gasta mais tempo dentro do app e encontra o que quer ouvir com menos fricção, o inventário se torna mais valioso e a experiência melhora sem canibalizar, em excesso, os incentivos para assinar.

Para o ecossistema brasileiro, que acompanha a expansão de recursos como daylist e o avanço recente do lossless, a atualização também pode influenciar estratégias de lançamento e promoção, já que links compartilhados por artistas nas redes passam a tocar de imediato no gratuito. Essa porta de entrada mais fluida favorece ações táticas em períodos de pico de descoberta e coloca o papel do social como gatilho de tráfego para o streaming.

Perspectivas

O passo do Spotify no gratuito não elimina o caráter freemium da plataforma. Ele reequilibra a experiência para corrigir atritos que afastavam jovens e para reforçar o negócio publicitário. Com limites diários ainda não divulgados e sem fila de reprodução para quem não assina, a empresa preserva a proposta de valor do Premium e dá sinais ao mercado de que a conversão continua sendo objetivo final do funil.

Nos próximos meses, a leitura de executivos e selos deve se concentrar em métricas de retenção, tempo de escuta e performance de campanhas no gratuito, além de acompanhar eventuais ajustes de política por território. O balanço entre atratividade do free e diferenciais do Premium seguirá no centro da estratégia, agora com uma camada adicional de conveniência para ampliar o alcance de lançamentos e manter a audiência dentro do app.

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