O YouTube volta ao centro de uma das discussões mais sensíveis do mercado fonográfico: como medir, de forma justa, o consumo de música na era do streaming. A plataforma anunciou que pretende interromper o envio voluntário de seus dados para os charts da Billboard a partir de 16 de janeiro de 2026, decisão que passa a valer nas paradas publicadas em 31 de janeiro.
A reação ocorre após a Billboard divulgar uma atualização na metodologia usada para calcular seus rankings, incluindo o Billboard Hot 100 e o Billboard 200. A publicação manteve a lógica de atribuir maior peso aos streams por assinatura em relação aos streams gratuitos com publicidade, mas reduziu a diferença entre as duas categorias.
Na prática, a mudança reabre um debate antigo entre plataformas, gravadoras e entidades da indústria: até que ponto diferentes tipos de stream representam o mesmo nível de engajamento do fã e o mesmo valor econômico para o artista.
O que muda na metodologia dos charts
A partir dos rankings datados de 17 de janeiro de 2026, uma unidade equivalente de álbum passará a considerar 2.500 streams gratuitos com anúncios ou 1.000 streams pagos sob demanda, seja em áudio ou vídeo. Antes, eram necessários 3.750 streams gratuitos ou 1.250 pagos para alcançar essa mesma unidade.
Com isso, a proporção entre streams pagos e gratuitos passa de 1:3 para 1:2,5. Em termos simples, serão necessários cerca de 33% menos streams gratuitos e 20% menos streams pagos para que um álbum contabilize uma unidade nos charts.
A mesma lógica será aplicada ao Billboard Hot 100 e às demais paradas de músicas. As métricas de vendas físicas e downloads digitais permanecem inalteradas.
Segundo a Billboard, o ajuste busca refletir o crescimento da receita vinda de assinaturas e mudanças no comportamento de consumo, em um mercado em que o streaming já responde por cerca de 84% da receita da indústria fonográfica dos Estados Unidos.
Por que o YouTube discorda

Apesar da redução na diferença de peso, o YouTube considera a mudança insuficiente. Em uma postagem no blog do YouTube Music, Lyor Cohen, chefe global de música da plataforma, afirmou que a fórmula adotada pela Billboard “não reflete como os fãs consomem música hoje”.
“Usar uma fórmula que pesa streams por assinatura mais do que streams com anúncios ignora o engajamento massivo de fãs que não possuem uma assinatura”, escreveu Cohen.
Para a plataforma, todas as reproduções deveriam contar da mesma forma, independentemente do modelo de monetização. A visão do YouTube é que um play representa interesse real do público, seja ele pago ou gratuito.
Cohen também destacou que o streaming é hoje a principal forma de acesso à música e que a diferenciação excessiva entre tipos de stream cria uma leitura distorcida da popularidade real de artistas e músicas.
A posição da Billboard e o histórico da disputa
Em resposta, um porta-voz da Billboard afirmou que a publicação busca medir a atividade dos fãs de maneira equilibrada, considerando fatores como receita, acesso do consumidor, validação de dados e orientação da indústria.
“Há muitas formas de um fã apoiar um artista, e cada uma tem um lugar específico no ecossistema da música”, afirmou o representante, acrescentando que a Billboard espera que o YouTube reconsidere sua decisão.
A diferenciação entre streams pagos e gratuitos não é nova. A Billboard adotou essa prática em 2018, seguindo um movimento já defendido por organizações internacionais como a IFPI. O argumento central sempre foi que um stream pago tende a indicar uma escolha mais ativa do consumidor e gera maior retorno financeiro para artistas e detentores de direitos.
Impactos para artistas, gravadoras e o mercado

Caso o YouTube realmente suspenda o envio de dados, as visualizações na plataforma deixarão de influenciar rankings importantes nos Estados Unidos. Isso pode afetar especialmente artistas com forte desempenho em vídeo, gêneros impulsionados por clipes virais e estratégias focadas em alcance massivo.
Por outro lado, o movimento também carrega riscos para o próprio YouTube, já que os charts da Billboard seguem sendo uma vitrine relevante para o mercado, imprensa e campanhas de marketing. Por isso, parte da indústria enxerga a decisão mais como uma tática de negociação do que como um rompimento definitivo.
O embate expõe uma tensão maior. Enquanto a indústria busca alinhar métricas a modelos de receita, plataformas defendem que popularidade e engajamento não podem ser medidos apenas pelo valor financeiro de cada play. O desfecho dessa disputa deve influenciar não só os charts, mas também futuras discussões sobre remuneração, métricas e transparência no streaming.
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