Tarifas de Trump impactam indústria musical com aumento de custos e repercussões globais

Setor musical enfrenta alta no preço de vinil, instrumentos e merchandising após anúncio de novas tarifas de importação por Donald Trump.
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Nathália Pandeló
Donald Trump

O anúncio feito por Donald Trump em 2 de abril sobre a imposição de tarifas de 10% sobre todas as importações e 25% sobre automóveis estrangeiros provocou reações em diversos setores da economia norte-americana. No caso da indústria musical, os impactos são sentidos tanto na cadeia de produção quanto na circulação internacional de artistas e produtos culturais.

A medida, que visa estimular a produção nacional dos Estados Unidos, afeta diretamente a importação de insumos utilizados na fabricação de discos de vinil, instrumentos e itens de merchandising

Além disso, setores associados à música, como o turismo cultural, também se preocupam com prejuízos devido à redução no fluxo de visitantes internacionais. A incerteza jurídica sobre quais itens culturais poderiam ser isentos das tarifas contribui para um cenário de instabilidade no mercado, já que até o momento apenas os eletrônicos se tornaram exceções à nova regra.

Alta nos custos de produção e incertezas legais

Boa parte da cadeia produtiva dos discos de vinil nos Estados Unidos depende de materiais importados, como PVC, papel para encartes e lacas. Segundo David Macias, da distribuidora independente Thirty Tigers, a elevação dos custos pode fazer com que um vinil passe a custar até US$ 35 por unidade. Ele afirma: “As pessoas pagarão isso, mas é um número assustador para os fãs”.

As dúvidas sobre a aplicação das tarifas a produtos culturais também atingem os selos independentes. A Associação Americana de Música Independente (A2IM) questiona se os discos de vinil podem ser protegidos pela “Emenda Berman”, dispositivo legal que impede a censura de materiais informativos por meio de restrições comerciais. Por ora, não há definição clara sobre a abrangência dessa proteção legal em relação à nova política tarifária.

Turismo musical e circulação internacional em queda

shows ao vivo, Eventim

O impacto das tarifas também é percebido no turismo ligado à música. A U.S. Travel Association projeta uma queda de até 10% no turismo canadense, o que afeta diretamente eventos como o CMA Fest, em Nashville. Segundo a organização, a imposição de tarifas gera retaliações e desincentiva a entrada de turistas, o que compromete a economia local.

Companhias aéreas também reagiram às mudanças. A canadense Flair Airlines cancelou seus voos para Nashville, eliminando 18 mil assentos disponíveis. A repercussão atinge ainda artistas que planejavam turnês nos Estados Unidos. Rob Oakie, diretor da Music PEI, declarou: “Há artistas que cancelaram suas turnês nos EUA. Eles têm medo de serem maltratados ou de pagar mais do que podem”.

Retaliações internacionais e efeitos sobre o digital

A resposta de outros países às tarifas impostas por Trump amplia os riscos para a indústria cultural norte-americana. A China, por exemplo, aplicou tarifas de 34% sobre produtos dos EUA. O Reino Unido também anunciou retaliações, o que afeta a exportação de bens e serviços culturais. Já a União Europeia poderá aplicar medidas com base no “Instrumento Anti-Coerção”, limitando o acesso de empresas americanas aos seus mercados digitais.

Esse cenário traz preocupações para plataformas de streaming como Spotify e Apple Music, que poderão enfrentar obstáculos regulatórios. Além disso, a distribuição digital de obras musicais pode ser comprometida em mercados estratégicos, prejudicando a remuneração de artistas e gravadoras independentes. Com boa parte das receitas do setor vindo do digital, essas barreiras têm efeito direto no caixa de empresas e criadores.

Instrumentos mais caros e pressão sobre fabricantes

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Foto: Divulgação

A indústria de instrumentos musicais também está entre as atingidas pelas tarifas. Muitos equipamentos ou partes são fabricados fora dos EUA, incluindo guitarras produzidas no México ou na Ásia. Mesmo produtos montados internamente utilizam componentes importados.

A escassez de peças e o aumento dos preços afetam diretamente pequenos fabricantes. Mike Matthews, fundador da Electro-Harmonix, empresa de pedais de efeito, afirmou à Rolling Stone: “Tudo isso é muito incerto agora. Eu considerei vender minha empresa”. A incerteza se estende a outros segmentos da cadeia musical, especialmente os que dependem de componentes eletrônicos específicos, como amplificadores e mixers.

Merchandising enfrenta aumento de preços

O setor de merchandising é outro a sofrer com os efeitos da nova política. Camisetas, casacos e jaquetas vendidos por artistas em shows e lojas virtuais são, em sua maioria, produzidos na China. Com as novas tarifas, os preços desses produtos aumentaram significativamente, comprometendo a margem de lucro dos artistas.

Segundo relatos obtidos pela Billboard, jaquetas personalizadas que antes custavam US$ 35 passaram a ser vendidas por até US$ 80. Uma fonte anônima ligada à produção de shows afirmou: “Não podemos repassar 100% do custo aos fãs, então precisamos reduzir nossas margens”. 

Para empresas que trabalham com alta rotatividade de coleções, como artistas em turnê, a velocidade da cadeia de produção chinesa ainda é insubstituível, o que limita a busca por alternativas.

Cenário incerto exige adaptação do setor musical

O cenário imposto pelas tarifas reflete uma mudança estrutural na forma como a indústria musical dos EUA se relaciona com o comércio global. De insumos técnicos a produtos de consumo, a cadeia inteira depende de importações para operar com eficiência.

Com margens cada vez mais apertadas e um ambiente internacional menos previsível, empresas e artistas avaliam novas formas de atuação. Ao mesmo tempo, a falta de clareza sobre o alcance da política tarifária impede decisões estratégicas mais seguras no curto prazo.

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