Enquanto o mercado musical brasileiro vive a era dos estádios superlotados e turnês milionárias, um outro ecossistema tenta sobreviver: o das casas de médio porte. Espaços como a Casa Natura Musical, com capacidade para 710 pessoas no formato tradicional, enfrentam o desafio diário de se manterem financeiramente viáveis sem abrir mão de sua missão cultural.
O fato de contar com um patrocinador de grande porte, no entanto, abre possibilidades que outros espaços não têm. Isso situa a venue como um caso raro no país – e, não por acaso, parada obrigatória em São Paulo para artistas do mid-stream nacional e até internacional.
“Quando eu falo que é uma casa com naming rights, isso nos coloca num lugar de poder oferecer uma infraestrutura tanto para o público quanto para os artistas. Acho que a Casa Natura Musical é reconhecida pelo seu sistema de som, pelo trabalho de acústica, por toda a equipe, pela experiência que a gente proporciona. Todos os lugares têm visão total. Isso tem muito a ver com o projeto, que está dentro dos nossos pilares de entrega, da Natura escolher a casa, dessa curadoria”, explica Suyanne Keidel, diretora executiva do espaço.
O novo projeto Jazz na Casa – Noites de Balanço Brasileiro, que estreia em 16 de abril com 11 shows até junho, exemplifica essa busca por um modelo sustentável que vá contra a corrente dos grandes eventos. Com capacidade reduzida para 246 pessoas, mesas, sofás e um cardápio assinado pelo chef Danillo Cocci, a iniciativa tenta criar um novo tipo de experiência cultural na cidade.
O objetivo é incentivar uma maior permanência do público, algo diferente do habitual na casa, onde muitos espectadores costumam chegar pouco antes do show e sair imediatamente após o término.
A programação musical inclui nomes consagrados como Gaia Wilmer e Jaques Morelenbaum, Trio Corrente e Léa Freire, com ingressos a preços acessíveis, variando entre R$ 30 e R$ 80.
O dilema das casas de médio porte: entre o artístico e o financeiro
As casas médias ocupam uma posição estratégica – e paradoxal – na cadeia da música. São essenciais para artistas em ascensão, mas economicamente frágeis. Suyanne detalha como a Casa Natura Musical navega por esse desafio:
“Apesar de ser uma casa de médio porte, a gente tem shows em formato mesa. Por exemplo, a gente abriu agora as vendas para Sophie Charlotte com Tom Veloso, que vai ser no formato mesa, com capacidade para 300, 350 pessoas. A gente vai fazer também Yamandú Costa em junho nesse formato. Então, a casa, ao longo desses 8 anos, vem testando vários formatos dentro do que é possível realizar e do que cada artista demanda.”
Suyanne reconhece a tensão inerente ao modelo:
“Hoje 90% da nossa programação é no formato pista, com 710 pessoas, porque isso no fim das contas é ticket, mais pessoas dentro da casa, mais consumo de alimentos e bebidas. Quanto mais pessoas, mais movimento. Mas a gente sempre experimentou, pensando também na música como protagonista.”
Naming rights com propósito: como a Natura moldou um espaço cultural
Diferente de muitos patrocínios culturais superficiais, a parceria entre a Natura e a casa se consolidou como um caso raro de branding bem-sucedido no setor. Suyanne explica:
“A Casa Natura Musical é um projeto alinhado aos propósitos da Natura, que tem uma plataforma (Natura Musical) completando 20 anos. Essa plataforma já direciona o que acontece na casa. A gente acaba sendo um lugar de relação perene com o público, os artistas e o mercado.”
O resultado é um espaço que consegue equilibrar artistas consagrados e novas vozes:
“Adoro contar que artistas como Luedji Luna e Liniker, que começaram com a Natura Musical, hoje voltam à casa em turnês incríveis. São artistas que começaram numa casa de médio porte e hoje estão em festivais ou turnês internacionais. A gente realiza 140, 150 shows por ano, e hoje mais de 60% são artistas independentes ou novas cenas.”
Desafios e oportunidades no cenário cultural atual

A diretora também comenta sobre os desafios de manter uma casa de shows em um mercado competitivo como São Paulo.
“Não é todo show que esgota, e a gente sabe disso. Tem eventos que vendem 400 ingressos, outros que lotam, e alguns que precisamos trabalhar mais, às vezes unindo dois artistas na mesma noite”, explica.
Ela destaca a importância da flexibilidade na programação e da criação de experiências únicas como fatores diferenciais.
“O Jazz na Casa é um exemplo disso: não se trata apenas do show, mas de toda a vivência que oferecemos em torno dele”, completa Suyanne.
Jazz na Casa: o desafio de criar público onde não há mercado massivo
O novo projeto representa um risco calculado. Jazz nunca foi um gênero de massas no Brasil, mas a aposta é na experiência premium. Suyanne detalha o pensamento por trás da iniciativa:
“A gente nunca tinha feito um projeto exclusivo de jazz. Sempre teve artistas como Milton Nascimento, ou mais intimistas como João Bosco, o próprio Hermeto Pascoal, mas nunca tínhamos criado um projeto específico. A casa nunca fez temporadas ao longo desses 8 anos, e a gente veio desenhando isso pensando no que poderíamos fazer, já que não temos um público formado, não há um lugar onde as pessoas já sabem que vão encontrar jazz.”
A solução foi criar um conceito 360 graus:
“Vai ser um espaço com sofás, mesinhas, mesa bistrô (quem quiser ficar em pé pode), os camarotes estarão disponíveis para quem quiser um lugar marcado, mas será um ambiente informal onde as pessoas possam curtir o pré-show também. A gente vai ter discotecagem de vinil, que é uma tendência. A gente vem acompanhando os listening bars, do speakeasy, essa coisa mais intimista”, entrega Suyanne.
O futuro: entre a experimentação e a sustentabilidade
Além do jazz, a casa segue com programação diversificada, incluindo shows internacionais como Hermanos Gutiérrez e Pedro Abrunhosa.
“A gente está sempre se questionando: o que mais podemos fazer para inovar?”, afirma Suyanne.
O Jazz na Casa servirá como um termômetro para futuras iniciativas, mas ainda não há definição sobre sua continuidade após junho. Questionada sobre planos futuros, Suyanne adianta que a casa está trabalhando em sua programação de aniversário, que acontece em maio.
“Estamos sempre planejando dois ou três meses à frente”, adianta.
Serviço
Jazz na Casa
1ª Temporada
16.04: Gaia Wilmer e Jaques Morelenbaum
Trem das Cores – Homenagem à música de Caetano Veloso
Ingressos: meia R$ 40 | inteira R$ 80 | mezanino R$ 160
23.04: Léa Freire Quinteto
50 anos de Paisagens Sonoras
Ingressos: meia R$ 30 | inteira R$ 60 | mezanino R$ 120
30.04: Salomão Soares e Guegué Medeiros – Part. Especial: Nailor Proveta
Baião de Dois
Ingressos: meia R$ 30 | inteira R$ 60 | mezanino R$ 120
07.05: Teco Cardoso, Bebê Kramer e Swami Jr.
Dança do Tempo
Ingressos: meia R$ 30 | inteira R$ 60 | mezanino R$ 120
14.05: Mestre Negro – A música de Moacir Santos
Com Paulo Braga, Daniel D’Alcantara, Josué dos Santos, Feldeman Oliveira, Gustavo Fonseca e Vinicius Teixeira
ingressos: meia R$ 40 | inteira R$ 80 | mezanino R$ 160
21.05: Alexandre Rodrigues Trio
Kaeté
Ingressos: meia R$ 30 | inteira R$ 60 | mezanino R$ 100
28.05: Projeto Tânia Maria
Batuque Feminino
Ingressos: meia R$ 30 | inteira R$ 60 | mezanino R$ 120
04.06: Tatiana Parra
Convida Antonio Loureiro, Bruno Migotto e Louise Woolley
Ingressos: meia R$ 30 | inteira R$ 60 | mezanino R$ 120
11.06: Maurício Pazz – Negro Movimento
Selo Atlântico Sul
Ingressos: meia R$ 30 | inteira R$ 60 | mezanino R$ 120
18.06: Mental Abstrato
Uzoma
Ingressos: meia R$ 30 | inteira R$ 60 | mezanino R$ 120
25.06: Trio Corrente
Ingressos: meia R$ 40 | inteira R$ 80 | mezanino R$ 160
Abertura da Casa: 18h30
Shows: 21h
Classificação: 18 anos