Spotify anuncia novas regras contra imitação, spam e uso de IA sem transparência

Em coletiva com a imprensa, o Spotify detalhou medidas para coibir deepfakes, fraudes de royalties e padronizar créditos de IA.
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Nathália Pandeló
Spotify
Crédito: Shantanu Kumar

A música sempre caminhou lado a lado com a tecnologia, da introdução de sintetizadores ao uso do Auto-Tune. Nos últimos dois anos, porém, a chegada de ferramentas de inteligência artificial generativa colocou a indústria diante de um novo desafio: lidar com uma enxurrada de conteúdos criados em escala industrial, muitas vezes sem autorização de artistas ou com intenção de fraudar sistemas de royalties.

Foi nesse contexto que o Spotify anunciou, em um press briefing exclusivo para veículos especializados, um pacote de três medidas que afetam diretamente artistas, produtores e distribuidores. 

A coletiva contou com a participação de Charlie Hellman, VP e Global Head of Music Vertical, e Sam Duboff, Global Head of Marketing & Policy no Spotify for Artists. O Mundo da Música esteve presente e questionou quantas músicas totalmente feitas por IA são enviadas diariamente à plataforma. A resposta de Duboff não incluiu números específicos, o que revela como o tema ainda é tratado com cautela dentro da empresa.

Imitação vocal sob novas regras

Entre os pontos centrais está a criação de uma política mais rígida contra deepfakes vocais e outras formas de imitação não autorizada. O Spotify determinou que qualquer uso de voz clonada por IA só será permitido quando houver autorização expressa do artista. Isso inclui tanto faixas inteiras quanto trechos em colaborações ou remixes.

A decisão atende a uma demanda crescente de músicos que tiveram seu repertório associado a lançamentos que nunca aprovaram. Além disso, a plataforma ampliará os mecanismos de denúncia de “conteúdo fora do lugar”, permitindo que casos sejam reportados ainda em fase de pré-lançamento. O objetivo é reduzir o tempo de resposta e evitar que fraudes circulem por semanas antes de serem retiradas do ar.

Filtro de spam para proteger royalties

Spotify tira álbum da The Velvet Sundown do ar
Spotify tira álbum da The Velvet Sundown do ar (Crédito: Reprodução)

Outra medida anunciada é o lançamento de um sistema de filtragem de spam musical. O recurso, que começa a ser implementado nos próximos meses, vai identificar práticas como uploads em massa, duplicações de faixas, manipulação de SEO e músicas artificialmente curtas. A lógica é simples: quanto mais material desse tipo entra na plataforma, mais os royalties são pulverizados e desviados de artistas profissionais.

O problema não é novo, mas ganhou escala com a IA. Qualquer pessoa pode hoje gerar centenas de faixas em minutos e tentar lucrar com elas. O Spotify afirmou que já removeu mais de 75 milhões de faixas de spam nos últimos doze meses, número que mostra a dimensão do desafio. O novo filtro busca evitar que esses conteúdos sequer cheguem às recomendações de usuários, diminuindo o risco de monetização indevida.

Transparência no uso da IA nos créditos

A terceira frente envolve transparência. Muitos artistas usam IA de forma parcial em seus processos, seja para criar arranjos, tratar vocais ou ajustar instrumentação. Até agora, porém, não havia um padrão claro para indicar isso nos créditos. O Spotify anunciou que passará a adotar o modelo desenvolvido pelo DDEX, consórcio que cria padrões de dados para a indústria fonográfica.

Esse novo formato permitirá identificar de forma precisa onde e como a IA foi usada em uma faixa, sem reduzir a questão a uma divisão binária entre “é IA” ou “não é IA”. Gravadoras e distribuidoras parceiras, como Believe, CD Baby, DistroKid, EMPIRE e FUGA, já estão alinhadas ao sistema. Para o público, a mudança representa mais clareza; para os profissionais, uma forma de preservar a confiança no ecossistema digital.

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Impactos práticos e próximos passos

As medidas apontam para um esforço do Spotify em equilibrar a liberdade criativa de quem escolhe usar IA com a necessidade de proteger artistas de fraudes. Para músicos e produtores, isso significa mais ferramentas de denúncia e maior transparência sobre como suas identidades sonoras são preservadas. Para os ouvintes, a promessa é de uma experiência menos poluída por conteúdos artificiais e mais confiável em termos de informação.

O produtor musical e CEO da Artist Partner Group, Mike Caren, compartilhou sua visão:

“É fundamental que os artistas saibam que seus parceiros estão contribuindo para a proteção de sua identidade e repertório. A transparência no uso da IA é essencial para construir confiança com os fãs. Esses avanços são passos importantes do Spotify na direção certa.”

Apesar do avanço, algumas questões permanecem em aberto. Ao mesmo tempo, a adoção de um padrão global de créditos sinaliza que a indústria tenta se antecipar a disputas jurídicas e fortalecer a credibilidade no streaming.

O movimento é um sinal de que, mais do que a tecnologia em si, o que está em jogo é a confiança entre artistas, plataformas e público. E essa confiança passa pela transparência, pela proteção contra abusos e pela clareza nas regras de remuneração.

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