A Autoridade de Concorrência da Turquia abriu uma investigação contra o Spotify por possíveis práticas anticompetitivas no mercado de streaming musical. O anúncio da apuração aconteceu no mesmo dia em que o vice-ministro da Cultura e Turismo, Batuhan Mumcu, utilizou as redes sociais para cobrar medidas legais contra a plataforma, acusando-a de recusar a retirada de playlists consideradas “ofensivas à religião islâmica” e à primeira-dama Emine Erdoğan, esposa do presidente Recep Tayyip Erdoğan.
Segundo comunicado oficial publicado na última sexta-feira (4), a autoridade reguladora vai apurar “diversas alegações de que as estratégias e políticas implementadas pelo Spotify […] na Turquia causaram efeitos anticompetitivos na indústria da música”. A investigação buscará identificar se a empresa sueca promoveu tratamento desigual a determinados artistas em termos de visibilidade na plataforma ou se praticou formas injustas de distribuição de royalties.
O órgão regulador também afirmou que pretende esclarecer se o Spotify dificultou a atuação de concorrentes no mercado turco e se houve discriminação entre criadores de conteúdo com base em seus relacionamentos contratuais.
Spotify diz cumprir leis locais
Em nota oficial enviada à imprensa, o Spotify declarou que “coopera com a investigação, está buscando ativamente compreendê-la e trabalhará por uma resolução rápida e construtiva com a Autoridade de Concorrência da Turquia”. A empresa também afirmou que suas operações estão em conformidade com “todas as leis aplicáveis” desde sua entrada no mercado turco em 2013, mas destacou que ainda não teve acesso aos detalhes sobre o escopo ou foco da apuração.
A plataforma evitou comentar diretamente as alegações relacionadas às playlists, mas reiterou seu papel no desenvolvimento da cena musical local. De acordo com o Spotify, em 2024 foram pagos mais de 2 bilhões de liras turcas (cerca de 25 milhões de dólares) à indústria musical do país.
A empresa também destacou que a proporção de streams de artistas turcos subiu de 11% em 2013 para 65% em 2025, e que o número de artistas locais presentes no top 100 anual da plataforma passou de 11 para 93 nomes em apenas uma década.

Deputado critica conteúdo ‘provocativo’
O caso ganhou contornos políticos após a manifestação pública de Batuhan Mumcu, que classificou o conteúdo de determinadas playlists como “insidiosamente provocativo e moralmente inaceitável”. Em seu perfil na rede social X (antigo Twitter), o vice-ministro afirmou que o Spotify “insiste em não tomar as medidas necessárias, apesar de todos os nossos avisos anteriores”.
Entre os exemplos citados por Mumcu, estão títulos de listas musicais como “Canções que o Profeta Muhammad ouvia na caverna” e “Playlist hotgirl de Emine Erdoğan”, esta última fazendo alusão a boatos sobre banheiros com torneiras de ouro no palácio presidencial.
Segundo o vice-ministro, os conteúdos “atacam nossos valores religiosos e nacionais e insultam as crenças da nossa sociedade”. Para ele, a postura da empresa representa uma “irresponsabilidade e falta de controle”, o que teria transformado a situação em “uma questão legal”.
Mumcu defendeu que o caso seja levado à Justiça e pediu que “as instituições competentes tomem providências”.
Censura e concorrência em pauta
Embora o Spotify tenha evitado comentar diretamente o conteúdo das playlists, o episódio reacende o debate sobre os limites entre liberdade de expressão e ofensa a valores religiosos em ambientes digitais. Na Turquia, a gestão de conteúdos considerados ofensivos ao Islã ou às instituições do Estado costuma gerar forte repercussão e, por vezes, embates legais.
O governo de Recep Tayyip Erdoğan, frequentemente acusado de restringir liberdades civis, já foi alvo de diversas críticas internacionais por seu histórico de repressão à liberdade de expressão e controle sobre o setor cultural e midiático.
Além da dimensão política e cultural, a investigação da autoridade de concorrência chama atenção pelo foco nas práticas comerciais da plataforma. A apuração se alinha a críticas já feitas globalmente ao modelo de remuneração do streaming, que envolve algoritmos de recomendação e repasses proporcionais a fatias de audiência. No contexto turco, as autoridades querem saber se a plataforma distorceu a concorrência ao beneficiar determinados artistas, o que pode afetar produtores locais e regionais.
A abertura da investigação coincide ainda com a consolidação de artistas turcos dentro da plataforma. Nos últimos anos, o país se tornou um dos mercados de maior crescimento do Spotify, o que aumenta a relevância comercial e cultural das decisões tomadas por sua operação no país.
A empresa reiterou que continuará cooperando com as autoridades locais. Ainda não há prazo definido para a conclusão da investigação nem indicação de possíveis penalidades caso sejam confirmadas infrações à legislação de concorrência.
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