Novo recorde nas paradas expõe era de hits que duram mais do que nunca no topo

Canções como “Lose Control”, de Teddy Swims, seguem batendo recordes de longevidade nas paradas dos EUA. O que explica esse fenômeno no mercado da música?
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Nathália Pandeló
Teddy Swims paradas
Teddy Swims

A era dos sucessos passageiros parece ter ficado para trás: cada vez mais músicas estão permanecendo por meses — ou até anos — no topo das paradas. A faixa “Lose Control”, do cantor e compositor Teddy Swims, é o exemplo mais recente e extremo dessa tendência. Com 92 semanas consecutivas na Billboard Hot 100, o hit se tornou a música com maior longevidade da história do ranking, superando o recorde anterior de “Heat Waves”, da banda Glass Animals.

Apesar de ter ocupado o primeiro lugar por apenas uma semana, em março de 2024, a canção mantém posição entre as 20 mais ouvidas mais de um ano após sua estreia, em agosto de 2023. São 63 semanas no top 10, marca inédita. 

E ela não está sozinha: outros hits recentes, como “Espresso”, de Sabrina Carpenter, e “Beautiful Things”, de Benson Boone, seguem há meses entre os destaques da parada sem darem sinais de esgotamento.

Mudança de comportamento e consolidação digital

Dados recentes mostram como esse padrão se acentuou. Na parada de 24 de maio de 2025, nenhuma música entre as 10 mais havia estreado há menos de dez semanas. A média de permanência das 20 músicas mais populares era de 30,35 semanas, contra 18,75 no mesmo período de 2020. Dez anos antes, apenas uma música no top 20 havia permanecido tanto tempo. Hoje, são nove.

Parte dessa durabilidade se deve ao impacto de 2024, considerado por especialistas um ano fora da curva para o pop, com o surgimento de artistas como Chappell Roan e a redescoberta de faixas antigas, como “party 4 u”, de Charli XCX, lançada em 2020 mas só agora chegando às paradas. 

Outro ponto a ser considerado é o contexto pós-pandêmico. Hits como “Blinding Lights”, de The Weeknd, e a própria “Heat Waves” nasceram durante o período de isolamento social e foram consumidos como trilhas sonoras de conforto. O contexto pedia conforto e familiaridade, e a música foi a companhia perfeita para isso.

Desenvolvimento mais lento, mas mais profundo

Benson Boone paradas
Benson Boone

Com o streaming, os lançamentos deixaram de ser tão dependentes do desempenho imediato no rádio. “Lose Control”, por exemplo, estreou na posição 99 e levou 32 semanas para alcançar o topo. Isso mostra que as pessoas estão levando mais tempo para absorver a música e aproveitá-la. Para especialistas, não se trata mais de um consumo rápido e descartável.

Essa transformação está diretamente ligada à mudança no modelo de desenvolvimento de artistas. Ao contrário do início da era TikTok, quando nomes virais eram rapidamente contratados e promovidos, hoje as gravadoras trabalham com planejamento de médio e longo prazo. Swims, por exemplo, assinou com a Warner Records ainda em 2019, após chamar atenção com covers no YouTube.

O comportamento do público nas plataformas também impacta diretamente nas estratégias de promoção. Billie Eilish, ao lançar o álbum “Hit Me Hard and Soft”, indicou “Lunch” como faixa principal, mas rapidamente os ouvintes migraram para “Birds of a Feather”, que acabou sendo impulsionada por playlists e pelas rádios, completando um ano no Hot 100.

Rádio, playlists e múltiplos singles

No passado, era raro que as estações de rádio colocassem várias músicas do mesmo artista em rotação ao mesmo tempo. Hoje, com o consumo pulverizado entre rádios e plataformas, os programadores conseguem equilibrar diferentes faixas simultaneamente. Isso alivia a fadiga e mantém as canções por mais tempo nas paradas.

Essa convivência entre novos artistas e hits duradouros também é explicada pela fragmentação do consumo musical. O excesso de opções fez com que apenas os maiores sucessos realmente se destaquem. 

Curiosamente, essa nova era não representa estagnação. Junto a nomes consolidados como Kendrick Lamar, SZA e Morgan Wallen, há espaço de destaque para revelações como Doechii, Alex Warren e Ravyn Lenae, que também frequentam o top 10 da Billboard. A coexistência entre estabilidade e renovação musical parece ser a fórmula atual da longevidade nas paradas.

A força dos algoritmos e o papel das plataformas

Outro fator decisivo para a permanência prolongada dos hits nas paradas é a forma como as plataformas digitais vêm utilizando seus algoritmos para manter os ouvintes engajados com músicas já conhecidas. No Spotify, por exemplo, as playlists editoriais e personalizadas — como “Today’s Top Hits” ou “Descobertas da Semana” — priorizam faixas com alto índice de retenção, criando um ciclo de exposição constante para as mesmas canções. Isso reduz a rotatividade nas principais paradas e reforça a dominância de alguns títulos por longos períodos.

Além disso, o comportamento do usuário colabora com essa lógica. Em vez de buscar constantemente novas músicas, muitos ouvintes preferem repetir as faixas com as quais já criaram uma conexão emocional, especialmente em momentos de rotina, estudo ou trabalho. Com a ajuda de assistentes virtuais, playlists automáticas e integração com redes sociais, esses hits são constantemente reativados no cotidiano digital.

O próprio design dos aplicativos estimula o consumo recorrente de músicas já conhecidas. Quando um usuário dá play em uma faixa popular, o algoritmo tende a sugerir outras canções similares ou até a mesma música em diferentes listas — um processo que favorece os grandes sucessos e dificulta a ascensão de novas faixas em larga escala. Assim, mesmo com uma produção musical em grande escala, poucas músicas conseguem furar esse bloqueio algorítmico.

Esse modelo consolida o que especialistas chamam de “longa cauda de exposição”, onde os maiores hits continuam sendo reproduzidos mesmo após meses de lançamento, sem depender de campanhas ativas de marketing ou lançamentos subsequentes. A consequência direta é um ambiente em que as paradas de sucesso refletem menos os lançamentos recentes e mais a estabilidade do que já conquistou grande volume de audiência — uma inversão em relação ao que se via nas décadas anteriores, quando o rádio e a TV promoviam uma renovação semanal quase obrigatória.

No fim das contas, a disputa pelo topo parece ter virado uma maratona — e não mais uma corrida de velocidade —, o que pode mudar de vez a forma como artistas e gravadoras pensam seus lançamentos.

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