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Projeto de lei nos EUA busca transparência no uso de obras protegidas para treinar IA

Senado americano propõe mecanismo para que artistas e criadores descubram se suas obras foram usadas em treinamentos de inteligência artificial.
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Nathália Pandeló
Senado Americano propõe lei sobre inteligência artificial (IA)

O Senador americano Peter Welch apresentou um projeto de lei no Congresso dos Estados Unidos para abordar a falta de transparência no uso de obras protegidas por direitos autorais no treinamento de modelos de inteligência artificial. Conhecido como TRAIN Act (Transparency and Responsibility for Artificial Intelligence Networks Act, ou Lei de Transparência e Responsabilidade para Redes de Inteligência Artificial), o texto propõe um processo administrativo que permite aos detentores de direitos solicitar informações sobre o uso de suas criações por empresas de IA.

A medida foi recebida com apoio de entidades ligadas à música e à cultura, incluindo a Associação da Indústria Fonográfica da América (Recording Industry Association of America  – RIAA), Associação Americana de Editores de Música (National Music Publishers’ Association – NMPA), a Federação Americana de Músicos (American Federation of Musicians – AFM) e a Academia de Gravação (Recording Academy). No entanto, a iniciativa enfrenta desafios para avançar no Senado, onde outros projetos relacionados à regulação de inteligência artificial ainda não obtiveram grande adesão.

Detalhes do projeto TRAIN Act

O TRAIN Act cria um mecanismo de intimação administrativa que facilita o acesso de criadores às informações sobre o uso de suas obras em treinamentos de IA. Segundo o texto, qualquer detentor de direitos que tenha “boa fé subjetiva” – ou seja, suspeita – de que sua obra foi utilizada pode solicitar a um tribunal distrital dos Estados Unidos que emita uma intimação. Isso obrigaria a empresa responsável pelo modelo de IA a fornecer registros que confirmem ou neguem o uso do conteúdo.

O senador Welch justificou a iniciativa destacando que, atualmente, os criadores não possuem uma forma confiável de verificar se suas obras estão sendo usadas sem permissão. 

“É por isso que apresentei um projeto de lei que ajuda os criadores a obter informações para determinar se suas obras foram usadas para treinar modelos de IA”, afirmou o parlamentar democrata. 

A falta de transparência foi descrita como um problema de “caixa-preta”, já que muitas empresas de inteligência artificial não divulgam os materiais usados em seus treinamentos.

Repercussões no setor cultural

A proposta foi elogiada por diversas organizações do setor cultural, que veem no projeto uma ferramenta para aumentar a responsabilidade das empresas de IA. Mitch Glazier, presidente da RIAA, destacou que o projeto é um passo necessário para garantir que os artistas tenham acesso a mecanismos legais em casos de uso não autorizado de suas obras.

Elizabeth Matthews, CEO da American Society of Composers, Authors and Publishers (ASCAP), afirmou que o TRAIN Act cria condições para que os criadores sejam devidamente informados sobre como suas produções estão sendo utilizadas. 

“O futuro da economia criativa depende de leis que protejam os direitos dos criadores humanos”, destacou.

Contudo, o projeto não determina compensação financeira automática para os detentores de direitos cujas obras tenham sido usadas. Essa questão permanece como um dos pontos centrais em debates judiciais e legislativos nos Estados Unidos, especialmente diante da defesa de empresas de IA de que o uso de obras protegidas em treinamentos seria uma prática amparada pela doutrina do “uso justo”.

Disputas legais e desafios do uso justo

inteligência artificial - IA

Enquanto o TRAIN Act tenta avançar no Congresso, tribunais norte-americanos avaliam casos em que empresas de inteligência artificial são acusadas de infringir direitos autorais ao utilizar obras protegidas em treinamentos. A defesa dessas empresas tem argumentado que essa prática se enquadra na doutrina de “uso justo”, uma interpretação que enfrenta resistência de artistas e organizações do setor.

Além disso, outros projetos de lei tentam abordar o tema sob diferentes perspectivas. O COPIED Act, por exemplo, busca tornar ilegal o uso de obras protegidas para treinar IA sem autorização. Por sua vez, a Generative AI Copyright Disclosure Act exige que empresas de IA notifiquem oficialmente quais materiais protegidos foram utilizados em seus modelos – uma demanda similar ao próprio TRAIN Act.

A regulamentação do setor de IA avança de forma lenta não apenas nos Estados Unidos, mas em todo o mundo, enquanto a tecnologia segue impactando áreas como criação musical, produção audiovisual e desenvolvimento de conteúdo digital. A ausência de um consenso entre legisladores, empresas de tecnologia e representantes da indústria criativa torna incerto o futuro de medidas legais voltadas para a inteligência artificial.

Próximos passos para a regulação da IA

Especialistas apontam que, embora o TRAIN Act traga um avanço ao estabelecer um processo administrativo para a transparência, ele ainda precisa superar barreiras no Congresso e na implementação prática. O senador Welch enfatizou que a proposta não resolve todas as questões relacionadas ao uso de inteligência artificial, mas representa um primeiro passo para proteger criadores e garantir um diálogo mais equilibrado entre a tecnologia e a propriedade intelectual.

Com o apoio de organizações representativas de artistas e criadores, o novo projeto já se tornou um dos mais relevantes no debate sobre a regulação de inteligência artificial nos Estados Unidos. Ainda não está claro se essa ou outras iniciativas vão conseguir equilibrar os interesses de criadores e desenvolvedores em um cenário que muda tão rápido.