MM Explica: Kneecap, o trio irlandês sob fogo cruzado após protesto pró-Palestina no Coachella

Grupo irlandês Kneecap usou o palco do festival para criticar Israel e os EUA, enfrentou censura e cancelamentos, mas recebeu apoio de mais de 40 artistas.
Foto de Nathália Pandeló
Nathália Pandeló
Kneecap
O trio irlandês Kneecap (Crédito: Divulgação)

O Coachella 2025 acabou em 20 de abril, mas não parece. Afinal, uma das atrações segue gerando manchetes e enfrentando consequências de sua performance no festival.

Estamos falando do grupo irlandês de hip-hop Kneecap, que usou o palco do festival como plataforma de protesto político, exibindo mensagens pró-Palestina e críticas ao governo israelense e ao apoio militar dos Estados Unidos. 

As manifestações, que incluíram a frase “F*** Israel. Free Palestine” nos telões e gritos de “Free Palestine” liderados pelo trio, não foram transmitidas ao vivo pelo YouTube, levando o grupo a acusar o festival de censura.

No segundo fim de semana do evento, o Kneecap voltou a se apresentar com o streamer Hasan Piker transmitindo o show ao vivo de forma independente. 

“Acreditamos que temos a obrigação de usar nossa plataforma para levantar a questão da Palestina, e era importante para nós nos manifestarmos no Coachella, já que os EUA são os principais financiadores e fornecedores de armas para Israel enquanto cometem genocídio em Gaza”, declarou Mo Chara, um dos integrantes, à Rolling Stone.

Cancelamentos e reação política no Reino Unido

Após o festival, o grupo passou a enfrentar uma série de repercussões. A agência Independent Artist Group encerrou seu contrato com o Kneecap, inviabilizando parte da turnê norte-americana prevista para outubro. 

Também houve cancelamentos de shows na Europa, como no Eden Sessions (Reino Unido) e nos festivais Hurricane e Southside (Alemanha). Outros eventos, como o Paradiso (Holanda) e Rock for People (República Tcheca), afirmaram que ainda estão avaliando a situação.

A American Airlines removeu de seu sistema de entretenimento o documentário do Kneecap, dirigido por Rich Peppiatt, exibido em festivais e premiado internacionalmente. 

Além disso, o grupo se tornou alvo de uma investigação por parte da unidade antiterrorismo da polícia britânica. O motivo são vídeos de shows anteriores em que integrantes teriam dito frases como “up Hamas, up Hezbollah” e “o único bom Tory é um Tory morto. Mate seu MP local” (Tory é o apelido do Partido Conservador britânico; MP significa “Member of Parliament”, ou seja, deputado do Parlamento do Reino Unido). 

A líder conservadora Kemi Badenoch exigiu que o grupo fosse processado, e o Glastonbury Festival passou a ser pressionado para excluir o Kneecap de sua edição deste ano.

Declarações e pedido de desculpas

Kneecap no Coachella
Kneecap no Coachella (Crédito: Reprodução)

Diante da controvérsia, o Kneecap publicou um comunicado dirigido às famílias dos parlamentares britânicos Jo Cox e David Amess, assassinados em atentados políticos, afirmando: “Nunca tivemos a intenção de causar dor a vocês.” O grupo nega apoiar organizações terroristas e afirma que seus comentários foram tirados de contexto.

A gravadora Heavenly Recordings, responsável pelo lançamento de seus álbuns, publicou uma carta aberta denunciando “uma tentativa clara e coordenada de censurar e, em última instância, silenciar” o grupo. A carta também acusa políticos britânicos de usarem o Kneecap como cortina de fumaça: “Kneecap não é a história. Gaza é a história. Genocídio é a história.”

Apoio de artistas e debate sobre liberdade artística

A carta da Heavenly recebeu apoio de mais de 40 artistas, incluindo Paul Weller, Primal Scream, Annie Mac, Massive Attack, Pulp, Fontaines D.C., Idles, Christy Moore, Sleaford Mods, entre outros. 

O texto afirma que “nenhum político ou partido deveria ter o direito de ditar quem pode ou não tocar em festivais ou shows” e defende o direito dos artistas de protestar contra crimes de guerra.

O coletivo Massive Attack também publicou uma declaração própria apoiando o Kneecap. Segundo os signatários, silenciar artistas que denunciam o sofrimento de civis em Gaza representa uma ameaça à liberdade artística em democracias que dizem valorizar os direitos humanos.

A pressão política segue aumentando. A polícia britânica afirmou estar analisando os vídeos com declarações polêmicas, o que pode gerar novas consequências para o trio.

Implicações para a indústria musical

O caso do Kneecap expõe tensões crescentes entre liberdade de expressão e limites impostos por plataformas, festivais e patrocinadores. Enquanto parte da indústria reforça o dever de proteger espaços para manifestações artísticas com teor político, outra parte se preocupa com repercussões legais, econômicas e de imagem.

Mesmo com as perdas contratuais, o trio continua promovendo sua música e suas convicções políticas com apoio crescente da cena artística alternativa. A controvérsia, longe de encerrar a trajetória do grupo, ampliou sua visibilidade internacional e transformou o Coachella 2025 em um palco de disputas que vão além da música.

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