A indústria da música em 2025 parece girar tanto em torno das canções quanto das narrativas que as sustentam. Lançamentos como o de Justin Bieber com o álbum “Swag” e a marca de roupas SKYLRK, ou mesmo a descoberta de que a The Velvet Sundown não passava de um projeto gerado por inteligência artificial, mostram como a linha entre arte, branding e performance nunca foi tão tênue. Do outro lado, artistas como Taylor Swift seguem comprovando que consistência narrativa é capaz de transformar um disco em fenômeno cultural global.
Para entender esse cenário, o Mundo da Música conversou com o publicitário digital Gil Pinna, especialista em branding e estratégia. Na entrevista, ele falou sobre autenticidade em tempos de algoritmos, o papel das IAs no mercado musical, os aprendizados dos grandes cases e como os artistas podem construir presenças de marca com significado em 2025.
A autenticidade como estratégia
Gil tem acompanhado de perto os movimentos de artistas que souberam transformar suas próprias histórias em diferenciais competitivos. Ele cita casos como Justin Bieber e Rosalía para ilustrar como a criatividade humana ainda se sobrepõe às fórmulas. Questionado sobre como um artista pode se manter autêntico em meio a um universo de fórmulas e supostas necessidades impostas por uma lógica algorítmica das plataformas, Pinna é categórico:
“Com Verdade Estratégica. Com aquilo que o artista tem de original, tanto em relação à sua autenticidade quanto em relação à sua origem. A história única de cada artista é o que trará conexão com a audiência através da identificação. Saber jogar o jogo do algoritmo é importante porque faz a mensagem chegar para mais pessoas, mas é a Verdade Estratégica contida nessa mensagem que irá trazer resultados reais para o negócio do artista.”
Para ele, os princípios que fundamentam uma boa narrativa sempre passam pela essência:
“O Bad Bunny voltou às suas origens latinas para se tornar sucesso global, o Tyler The Creator assumiu sua sensibilidade para se destacar no mundo do rap e ir além na moda, na arte, etc. É algo que os artistas já fazem em suas próprias músicas, como o Emicida gravando em Angola e o próprio Justin sampleando um som registrado em vídeo, que ele mesmo fez na sua infância”, exemplifica, citando uma das estratégias aplicadas no recente lançamento do álbum “Swag”.
Humanização diante das máquinas

Se a autenticidade é central, como conciliar esse valor com o avanço da inteligência artificial no setor? Gil enxerga o crescimento das ferramentas como inevitável, mas acredita que elas trazem um desafio ainda maior: a abundância de conteúdos irrelevantes.
“As IAs já estão contribuindo para o crescimento exponencial do lixo eletrônico das redes sociais. Grandes artistas acabam disputando a atenção da audiência com o jovem entusiasta de IA que criou uma música usando somente o Suno em seu computador. Mas se uma pessoa comum é capaz de tirar uma limonada da IA, o que um grande artista é capaz de fazer.”
Para ele, o diferencial está em como o artista valoriza um de seus mais valiosos recursos.
“O artista não pode parar no tempo. Mas ele deve valorizar o seu tempo. E mostrar isso para o público. Por exemplo: o Jão anunciou que vai ficar offline. Ele poderia simplesmente ficar. Mas ele comunicou e isso tem a ver com o seu branding. Ele está construindo um storytelling, que não necessariamente é uma ação de marketing. Pode ser (e eu acredito que seja) algo humano, artístico, verdadeiro.”
Nesse contexto, a construção de uma identidade audiovisual aparece como alternativa para equilibrar presença digital e saúde mental. Afinal, o grande desafio é construir uma cadeia de conteúdos relevantes.
Gil Pinna pontua que isso é possível ser feito “encontrando uma Identidade Audiovisual. Um jeito único, criativo e estratégico, de mostrar sua arte. Isso trará uma rotina na criação e na produção de conteúdo, otimizando o tempo e preservando tanto a arte quanto a saúde mental do artista.”
O aprendizado com Justin Bieber
Um dos casos mais recentes analisados por Gil foi a estratégia de Justin Bieber com o álbum “Swag”, em que música e moda se conectaram em um mesmo lançamento. Para ele, o segredo está em transformar o próprio artista em notícia.
“Criar um buzz sempre foi ponto chave para grandes artistas. E isso depende de investimento e criatividade. A Rosalía criou uma fonte no Instagram. Tem a ver com investimento, mas também com criatividade. O Justin ‘surgiu’ com o álbum e isso gerou burburinho.”
Segundo ele, existe um exercício simples que pode orientar artistas:
“Crie uma manchete de jornal sobre a sua ideia (neste caso, o lançamento do seu álbum ou da sua música), de uma forma que essa notícia desperte curiosidade, identificação e compartilhamentos. Por exemplo: Justin lança seu novo álbum sem avisar os fãs. Ou cantora cria letra personalizada para usuários do Instagram.”
A intencionalidade, afirma Gil, é o que separa uma estratégia consistente de um gesto forçado.
“Quando você traz simbologias, você propõe a identificação, e isso cria e fortalece a sua comunidade. As pessoas não se conectam apenas com as músicas do Gorillaz, mas sim quando cada significado dessa história. A música do Racionais é primorosa, mas as simbologias por trás de cada fala e de cada silêncio fortalecem a marca, em conexão com o público.”
Taylor Swift e a lógica do hype
Se Bieber ensina sobre antecipação, Taylor Swift é exemplo de consistência narrativa. Com o anúncio de seu 12º álbum, a artista gerou ondas de engajamento que ultrapassaram o campo da música, arrastando marcas como Itaú, Duolingo e até o X (ex-Twitter) para o hype cultural.
Gil vê na estratégia da cantora um domínio absoluto sobre sua própria verdade e estética. Cada detalhe (cor, fonte, figurino, escolha do canal de anúncio) se transforma em peça de um quebra-cabeça maior, capaz de mobilizar comunidades inteiras. Para ele, esse é um lembrete de que não basta acompanhar tendências: é preciso ter clareza de identidade antes de se inserir em qualquer movimento.
O futuro do branding musical
Questionado sobre quais dicas daria a artistas e profissionais em 2025, Gil resume em três pontos práticos:
“Primeiro e mais importante: valorize a sua verdade estratégica. Ou seja: o que é que você tem de origem/original que é estrategicamente útil e atraente para o público?
Segundo: não foque no sucesso. Foque no processo. Não queira copiar o que o grande está fazendo e procure entender o que ele fez para se tornar grande.
E terceiro: frequência. Se o seu perfil ainda não bombou é porque você ainda não errou o suficiente até acertar.”
Na visão do especialista, o futuro do mercado dependerá da capacidade de artistas equilibrarem narrativas autênticas com o uso consciente de ferramentas digitais. Mais do que buscar fórmulas prontas, a música de 2025 convida cada criador a entender que sua história é, também, sua marca.
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