Brasileiros criam detector que identifica uso de inteligência artificial em composições

Solução da TuneTraders promete rastrear com precisão músicas geradas por inteligência artificial e garantir transparência na remuneração de criadores humanos.
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Nathália Pandeló
TuneTraders desenvolve tecnologia de detecção de inteligência artificial na música
TuneTraders desenvolve tecnologia de detecção de inteligência artificial na música (Crédito: Divulgação)

Uma tecnologia desenvolvida no Brasil promete ajudar a indústria da música a identificar, com precisão, se uma faixa foi criada com auxílio de inteligência artificial. Lançado pela startup TuneTraders, o novo detector é capaz de apontar a presença de IA na produção musical, quais obras foram usadas para treinar os modelos generativos e em quais trechos da canção essas influências aparecem.

O sistema faz parte de um protocolo criado pela empresa e lastreado em blockchain, oferecendo rastreabilidade, aferição e auditoria de ponta a ponta. A proposta é que artistas, distribuidoras, plataformas e entidades reguladoras possam identificar com clareza se uma música foi gerada por IA e garantir que criadores humanos sejam remunerados sempre que suas obras forem utilizadas no processo de machine learning.

Um protocolo auditável e em blockchain

O projeto nasceu durante a pandemia, quando os cofundadores Carlos Gayotto e Maurício Magaldi começaram a estudar o tema a partir de pesquisas da Berklee College of Music, em parceria com o MIT. Desde então, o protocolo foi ficando mais robusto, até incorporar, recentemente, o detector de IA.

“Com mais de 75% de acurácia, o nosso detector consegue sinalizar se a música foi feita ou não com IA, se ela tem algum componente de uma obra anterior naquele machine learning, que é o aprendizado que a máquina obteve para criar uma nova obra. Isso faz com que, no médio e longo prazos, obras que foram utilizadas para fazer a máquina aprender e tirar suas conclusões para criar uma nova música possam ser devidamente remuneradas. E é uma tecnologia nossa, 100% brasileira”, explica Gayotto. 

Segundo a empresa, a blockchain entra como tecnologia-chave para dar segurança e transparência ao processo. 

“Ela é uma tecnologia que funciona como um registro eletrônico de transações, onde as informações são registradas entre si de forma segura, transparente e impossível de ser alterada sem o consenso da rede, que são os atores que aderiram àquele protocolo, neste caso, músicos, distribuidoras, gravadoras, entidades, etc”, afirma Gayotto.

Resposta concreta à crise da autoria

Carlos Gayotto, CEO e fundador da TuneTraders
Carlos Gayotto, CEO e fundador da TuneTraders (Crédito: Divulgação)

A iniciativa da TuneTraders surge num momento em que o volume de músicas geradas por IA vem crescendo em ritmo acelerado. Em abril, a Deezer divulgou que recebe cerca de 20 mil faixas geradas por inteligência artificial por dia. Para muitos profissionais da música, isso reforça a urgência de se estabelecer parâmetros claros sobre o que é criação humana e o que é conteúdo sintético.

A ferramenta foi pensada não como um bloqueio ao uso de inteligência artificial, mas como um mecanismo de consenso que possa ser adotado por entidades como o ECAD e associações de arrecadação. 

O objetivo é criar critérios técnicos e auditáveis que sustentem políticas de remuneração justa e contenham abusos. Até o momento, segundo Gayotto, há resistência por parte de algumas gravadoras, mas a empresa segue dialogando com diferentes atores do setor.

“Estamos reunindo o mercado e todos os atores do setor fonográfico brasileiro, conversando com órgãos reguladores, governo, gravadoras – essas, infelizmente, estão menos interessadas neste momento em conseguir identificar e pagar quem deve, mas em breve elas devem voltar a conversar com a gente. No entanto, estamos juntando todo mundo para que a gente consiga atingir o nosso principal objetivo: distribuir melhor receita para artistas, criadores e para a criação humana em geral”, aponta. 

Caminho para regulamentação e consenso

A TuneTraders vem convidando músicos, plataformas de streaming, distribuidoras e associações para testar e adotar o protocolo. A ideia é estabelecer uma infraestrutura sólida, que possa embasar regulamentações futuras e garantir mais equilíbrio entre inovação tecnológica e valorização da autoria.

A startup também opera a plataforma Tuneplay, que permite a divisão direta de royalties entre artistas e fãs, sem intermediários. Baseada na lógica da Web3, a solução transforma cada obra em um ativo digital auditável, e cada artista em uma possível DAO (Organização Autônoma Descentralizada). Nomes como Zeca Baleiro, Ivan Lins, Tiê e Paulo Novaes já participaram de iniciativas da empresa.

A ferramenta de detecção de inteligência artificial já está disponível para testes e pode ser integrada a outras plataformas. Com ela, a TuneTraders aposta em um novo modelo de gestão da propriedade intelectual no setor musical, mais compatível com os desafios e possibilidades trazidos pela inteligência artificial.

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