CAF e Instituto Feira Preta anunciam investimento de US$ 500 mil em afroempreendedorismo na América Latina

CAF inicia nova etapa com investimento de meio milhão de dólares, expansão para sete países e ações de formação voltadas a negócios liderados por pessoas negras.
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Nathália Pandeló
Sede do CAF
Sede do CAF (Crédito: Divulgação)

A segunda fase do programa de afroempreendedorismo do Banco de Desenvolvimento da América Latina e do Caribe (CAF) foi oficialmente lançada durante o Festival Feira Preta, em Salvador, marcando a ampliação de um projeto que já vinha ganhando corpo desde 2024. O banco aposta em uma combinação de pesquisa atualizada, formação e fortalecimento de redes para apoiar negócios criados por pessoas negras em diferentes países da região. O movimento envolve US$ 500 mil somados entre aportes da instituição e contrapartidas não financeiras oferecidas pelo Instituto Feira Preta, que incluem metodologia, espaços estruturados e experiência acumulada em iniciativas de impacto social.

A escolha da Feira Preta como palco do anúncio reforça o alinhamento entre pesquisa, cultura e políticas que estimulam o empreendedorismo negro. O festival, realizado em Salvador, reúne lideranças e especialistas e ajuda a impulsionar discussões sobre inclusão econômica e construção de oportunidades para populações historicamente excluídas. É nesse contexto que a segunda fase do programa se estrutura e se volta à implementação prática das recomendações geradas pelo estudo que inaugurou o projeto.

A primeira fase da pesquisa

edital Mulher artista negra

A primeira etapa foi divulgada no fim de 2024 e se tornou o primeiro levantamento regional sobre afroempreendedorismo na América Latina. Conduzido pelo Banco CAF, pelo Instituto Feira Preta e pelo Plano CDE, o estudo buscou compreender o perfil e os desafios enfrentados por empreendedores negros de cinco países: Brasil, Argentina, Colômbia, Panamá e Peru. Foram ouvidos cerca de 3 mil participantes, com uma metodologia que uniu análises qualitativas e quantitativas para identificar padrões e necessidades prioritárias.

Os resultados revelaram obstáculos estruturais, incluindo barreiras de crédito e ambientes bancários pouco receptivos. No Brasil, por exemplo, o levantamento mostrou que 44% dos pedidos de crédito feitos por empreendedores negros foram negados, enquanto entre brancos esse percentual foi de 29%. 

Os dados também mostraram que quase 60% dos negócios nasceram durante a pandemia, impulsionados pela urgência de gerar renda. Outro ponto relevante foi a presença majoritária de mulheres nesse ecossistema, chegando a 80% da amostra em alguns países da região, embora quase metade dos empreendimentos liderados por elas movimente até um salário mínimo.

A pesquisa ainda destacou que muitos negócios negros surgem com forte dimensão identitária. O estudo mostrou que empreendedores constroem suas iniciativas com base em laços comunitários, memória ancestral e oferta de serviços com referências culturais próprias. Entre os brasileiros entrevistados, 8 em cada 10 atuam seguindo práticas alinhadas a ESG, o que indica compromisso socioambiental. Em todos os países analisados, foram mencionados desafios ligados à discriminação racial, falta de garantias financeiras e restrições no acesso a instituições de crédito.

O que muda com a segunda fase

Com o lançamento da nova etapa no Festival Feira Preta, o projeto deixa de ser apenas um diagnóstico e passa a investir na implementação de soluções. A pesquisa será ampliada para Equador e Uruguai, chegando a sete nações contempladas. A expectativa é alcançar dez países em futuro próximo, fortalecendo uma leitura mais completa sobre as dinâmicas do afroempreendedorismo na região.

Entre as ações anunciadas está a criação de programas de formação voltados a capacitar afroempreendedores em áreas estratégicas. A ideia é oferecer ferramentas que respondam aos desafios identificados na primeira etapa, desde gestão de negócios até acesso a mercados. Essa fase contará com US$ 250 mil investidos pelo CAF e outros US$ 250 mil em contrapartidas do Instituto Feira Preta.

Outro ponto central é a construção de uma rede latino-americana de afroempreendedores. A iniciativa busca estimular conexões, trocas e oportunidades entre os diversos países envolvidos, consolidando vínculos e compartilhando experiências de quem atua em contextos parecidos. O projeto também prevê apoio ao desenho de políticas públicas, utilizando dados científicos para orientar gestores locais e nacionais no desenvolvimento de iniciativas voltadas à equidade racial.

Por que Salvador e a Feira Preta

Fesitval Feira Preta em 2024
Fesitval Feira Preta em 2024 (Crédito: Divulgação)

O anúncio em Salvador trouxe simbolismo e estratégia para a nova fase. Em sua fala, Eddy Bermúdez, diretor de Diversidade do Banco CAF, afirmou: 

“Escolhemos Salvador porque esta cidade guarda uma história poderosa para a população negra e representa um dos ecossistemas mais vibrantes do afroempreendedorismo no mundo. Fazer esse anúncio na Feira Preta, que há anos impulsiona negócios, cultura e inovação de pessoas negras, significa fortalecer uma aliança que já está transformando a região. Aqui se reúne o ambiente perfeito para falar de oportunidades, redes e desenvolvimento”.

A fundadora da Feira Preta, Adriana Barbosa, também destacou a sintonia entre as duas instituições e a importância do estudo. 

“O Festival Feira Preta sempre foi um espaço de construção de narrativa, mercado e protagonismo para pessoas negras. Ver o CAF ampliando esta pesquisa e transformando seus resultados em ações concretas de apoio aos negócios é um movimento que dialoga diretamente com o que fazemos há mais de duas décadas. Pesquisa, dados e políticas públicas precisam caminhar junto com cultura, mercado e inovação, e é isso que esta aliança representa.”

Com a expansão do projeto, a parceria entre o CAF e o Instituto Feira Preta busca fortalecer a economia negra na América Latina por meio de uma combinação de dados, formação, redes e ações governamentais. A etapa marca uma inflexão que transforma recomendações em programas práticos, criando um ambiente mais favorável para empreendedores em diferentes países e reforçando o papel da Feira Preta como articuladora regional.

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