Dando continuidade à série de entrevistas do “Balanço 2025”, o Mundo da Música joga seu olhar para além de números de streaming e plataformas digitais e entra no território da curadoria, da produção audiovisual e da construção de espaços dedicados à descoberta musical – estes últimos, cada vez mais raros na TV. Em um ano marcado por decisões cada vez mais orientadas por dados e algoritmos, projetos que apostam em critérios humanos e editoriais ganharam relevância no debate sobre o futuro da música.
É nesse contexto que se insere O Novo Sempre Vem, programa produzido pela Trama e exibido pela TV Cultura, que ao longo de sua primeira temporada se consolidou como uma vitrine para artistas da cena independente brasileira. Gravado em estúdio, sem entrevistas ou elementos externos à performance, o projeto aposta na música como eixo central, criando registros de alta qualidade sonora e visual que dialogam tanto com a TV quanto com o consumo digital.
Para analisar os aprendizados de 2025, os impactos concretos na carreira dos artistas e o papel do programa como registro da produção contemporânea, o MM ouviu João Marcello Bôscoli e André Szajman, sócios da Trama. Na conversa, eles detalham a evolução da curadoria, os desafios técnicos da temporada, a leitura de audiência em múltiplas plataformas e como O Novo Sempre Vem se posiciona como um acervo vivo da nova música brasileira.
Balanço 2025 com João Marcello Bôscoli e André Szajman, sócios da Trama
Mundo da Música: A temporada consolidou o programa como um espaço para descobertas musicais. Que avanços vocês enxergam na curadoria e na forma de apresentar novos artistas em comparação ao início do projeto?
João Marcello Bôscoli: O primeiro ponto é a fluência das pessoas todas envolvidas na gravação. A repetição dos processos (chegada, montagem, passagem de som, alinhamento de câmeras, afinação de luz, escolha de microfones) vai aperfeiçoando a manufatura do programa. O segundo é a repercussão entre os músicos e produtoras, que passaram a considerar o programa como algo que soma na carreira e começaram a nos procurar para participar.
Mundo da Música: O programa se propõe a valorizar o frescor da cena independente, longe de decisões algorítmicas. Quais foram os aprendizados sobre esse modelo mais humano de descoberta e como isso influenciou as escolhas ao longo da temporada?
JMB: O maior aprendizado é realizado vendo todo mundo tocando junto no estúdio, se olhando, usando a tecnologia como ferramenta, como instrumento, sempre sob o comando humano.
Mundo da Música: Muitas pessoas comentam sobre a qualidade sonora e visual das sessões. Para vocês, quais elementos da produção tiveram o maior impacto na forma como o público passou a consumir e interpretar essas performances?
JMB: Como o programa é gravado em um estúdio de gravação, Trama NaCena, e não há entrevista ou qualquer elemento fora a performance musical em si, os laços criados são estritamente musicais. Ou seja: a música é a razão, é o que liga tudo e todos.

Mundo da Música: Falando em audiência e retorno, como vocês medem a aceitação do público? Quais indicadores são mais reveladores para entender se as sessões estão chegando às pessoas certas?
André Szajman: Medimos pelo número consolidado que soma duas apresentações semanais em TV aberta, cinco exibições semanais do programa em rede no rádio, pelas redes sociais, pelo nosso canal Trama TV no YouTube e na imprensa especializada. O crescimento tem sido orgânico e consistente; afinal, ao somarmos o público de mais de 60 artistas, temos uma plateia substancial. E o melhor, gente que quer ouvir música, nossa causa, consequência e razão de existir.
Mundo da Música: A série acaba funcionando como uma vitrine para artistas que ainda não tinham espaço na mídia tradicional, numa era em que a música ocupa cada vez menos espaço na TV. Que tipo de efeito concreto vocês já observaram na carreira desses músicos após participarem do programa?
JMB: Com quem conversamos, o que mais escutamos é que estão felizes com o registro em si, com a qualidade da produção e com essa “vitrine” que você citou. E também como esse material tem ajudado nas vendas de shows e na melhora nos números de streams, impulsionando o restante do catálogo de cada um, sobretudo no período de exibição de sua participação no programa, impulsionado por nossa equipe de marketing e comunicação, que busca continuamente potencializar o alcance.
Mundo da Música: O Novo Sempre Vem também ajuda a documentar a nova cena nacional. Em que medida vocês enxergam o programa como parte de um registro histórico dessa geração de artistas?
JMB: Nosso papel é gerar um acervo que represente, em alguma medida, o momento musical que o Brasil vive hoje, criando um registro da produção contemporânea. Nos vejo como documentaristas musicais com a sorte de ter uma grande quantidade de talentos dispostos a vir ao nosso estúdio e participar. Sem os músicos, sem a exuberância da música brasileira, teríamos nada.
Mundo da Música: Por trás de cada episódio existe um processo intenso de produção e direção. Quais desafios técnicos e artísticos mais se destacaram nesta temporada?
JMB: Gravar mais de 500 faixas em 32 diárias é o maior desafio. A harmonia entre as equipes de produção, áudio, vídeo e os músicos que conseguimos alcançar é muito especial e, pela minha experiência, algo raro. Porque, quando falamos “gravando”, toda a parte técnica precisa ficar invisível. Buscamos uma atmosfera de concentração e intimidade.
Mundo da Música: O programa é exibido na TV Cultura, mas também ganha vida nas plataformas digitais. Como vocês equilibram o formato televisivo com o consumo fragmentado e rápido da internet?
AS: Logo após a primeira exibição na TV, subimos o programa na íntegra (e também separado em singles) no nosso canal Trama TV. Percebemos que as coisas se alimentam, se somam e que as pessoas têm comportamentos diferentes ao longo do seu dia no que diz respeito à sua relação com a música. Também merece destaque a habilidade que os artistas de hoje têm em usar as ferramentas de promoção em consonância com nossa equipe da Trama.
Mundo da Música: Observando o impacto da primeira temporada, que caminhos criativos começam a aparecer para a próxima? Há vontade de expandir formatos, parcerias, gêneros ou novos recortes da cena independente?
JMB: Sim, queremos expandir as parcerias e acolher mais e mais gêneros musicais. Quanto ao formato, um pocket show do artista tocando ao vivo com uma boa estrutura de captação, estamos satisfeitos.
Mundo da Música: Como um programa que envolve estúdio, equipe técnica, produção audiovisual em 4K e alto padrão sonoro exige investimentos relevantes, como vocês equilibram esses custos e fazem a conta fechar para manter uma temporada sustentável?
AS: Isso só é possível com o apoio das marcas e agências, pessoas que gostam de música, apoiam e percebem o seu poder de comunicação e a importância histórica desse registro. Somado a um planejamento bem antecipado de todos os processos e a uma execução cuidadosa, colocando todos os recursos na música, conseguimos sustentar o projeto com qualidade.
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