Spotify remove álbum do The Velvet Sundown; plataformas tomam primeiras atitudes contra banda feita com IA

Spotify retira do ar álbum e singles do The Velvet Sundown, que também sumiram do YouTube e Apple Music, em meio a debates sobre IA no streaming.
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Nathália Pandeló
Spotify tira álbum da The Velvet Sundown do ar
Spotify tira álbum da The Velvet Sundown do ar (Crédito: Reprodução)

O Spotify removeu o álbum Paper Sun Rebellion II e diversos singles do projeto The Velvet Sundown, banda gerada por inteligência artificial que vinha acumulando milhões de streams e chamando atenção pelo ritmo acelerado de lançamentos. 

O movimento também foi seguido por outras plataformas como YouTube e Apple Music, que não disponibilizam mais os mesmos conteúdos. Para quem acompanha a indústria, esse não é um caso isolado: todos os dias, milhares de faixas automatizadas chegam aos serviços de streaming, pressionando os sistemas de recomendação e o modelo de remuneração.

O The Velvet Sundown apareceu repentinamente em junho de 2025, sem gravadora, histórico prévio, turnê ou presença verificável fora do ambiente digital. As imagens de divulgação mostravam integrantes com visual gerado por IA e nomes como “Gabe Farrow” e “Orion ‘Rio’ Del Mar”, desconhecidos no meio musical. 

Em poucas semanas, a banda somou quase 1,4 milhão de ouvintes mensais no Spotify, entrando em playlists populares como “Descobertas da Semana” e “Vietnam War Music” e lançando nada menos que quatro álbuns em três semanas.

Plataformas começam a agir

Nas últimas semanas, além das retiradas no Spotify, o álbum Paper Sun Rebellion II também desapareceu do YouTube e do Apple Music. O Spotify optou por não comentar oficialmente o motivo das remoções, mantendo o silêncio que já marcava sua postura diante do caso. Esse é apenas um entre inúmeros exemplos de conteúdos gerados por IA que circulam livremente nas plataformas sem identificação ou curadoria específica.

Segundo dados divulgados pela Deezer em abril, cerca de 20 mil faixas geradas automaticamente são enviadas diariamente à plataforma, representando 18% do total de uploads. O Spotify ainda não adota um sistema de rotulação, o que facilita que projetos como o Velvet Sundown sejam incluídos em playlists ao lado de artistas humanos, sem que o público saiba a origem automatizada do conteúdo.

Impacto no mercado e disputa por espaço

The Velvet Sundown comemora o sucesso dos dois primeiros álbuns comendo hambúrgueres Spotify
The Velvet Sundown comemora o sucesso dos dois primeiros álbuns comendo hambúrgueres (Crédito: Reprodução)

O avanço da inteligência artificial no streaming não é meramente uma curiosidade tecnológica, mas uma questão com impacto econômico real. Hoje, músicas criadas por IA disputam diretamente os mesmos centavos por play que artistas reais, mesmo sem arcar com custos de estúdio, músicos, gravação ou marketing. O modelo pró-rata, adotado por plataformas como o Spotify, distribui cerca de 70% da receita gerada para os detentores de direitos, o que amplia a desigualdade quando conteúdos automatizados ocupam espaço e geram receita equivalente.

Além disso, as suspeitas de uso de bots para inflar números e manipular algoritmos de recomendação aumentam as preocupações. Investigações apontam para o surgimento de “bandas fantasmas” com milhões de plays em poucas semanas, sem histórico verificável. Um exemplo recente é o do projeto The Devil Inside, que ultrapassou 1,6 milhão de reproduções pouco depois de aparecer nas plataformas.

Um debate que cresce na indústria

A retirada do The Velvet Sundown não resolve os desafios, mas sinaliza que as plataformas começam a reagir diante da pressão crescente de artistas, gravadoras e entidades do setor. Entre as medidas em discussão estão a rotulação obrigatória de conteúdos gerados por IA e a adoção de modelos de pagamento centrados no usuário, em que o dinheiro do assinante vai diretamente para os artistas que ele ouviu.

Relatórios como o da CISAC (Confederação Internacional de Sociedades de Autores e Compositores) alertam que a indústria criativa pode perder até 24% de sua receita até 2028 devido ao crescimento não regulado da IA. Isso equivale a mais de €10 bilhões apenas no setor musical, afetando compositores, intérpretes, produtores e equipes que sustentam a cadeia produtiva da música.

O caso do Velvet Sundown deixa claro que a discussão não é apenas sobre tecnologia, mas sobre transparência, ética e sustentabilidade cultural. Enquanto a inteligência artificial oferece ferramentas potentes, ela também exige regras claras para garantir que a música continue sendo um espaço para criatividade humana e remuneração justa.

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